Contando Histórias

23.06.2021

Entrevista concedida ao Professor João Rosa Correia pelo casal: Hermelino Ferreira/Tereza Tieschner Ferreira, ex-moradores de Santa Helena.

Quinta-feira 16 de janeiro de 2020, entrevistei Hermelino Ferreira e Tereza T. Ferreira quando estes estiveram visitando Matheus (neto do casal) que reside na área rural em São Clemente, distrito de Santa Helena. Hermelino descendente de portugues e indígena e Tereza de italiano e alemã. Pais de Hermelino, Pedro Ferreira (agricultor/carpinteiro) e Otília de Souza (agricultora/do lar), pais de Tereza, André Tieschner (agricultor) e Joana Depiné (agricultora/do lar). Tereza nasceu no dia 27 de fevereiro de 1951 em Santa Catarina, Hermelino, no dia 07 de julho de 1945 no RS.

No ano de 1952 os pais de Tereza que trabalhavam na agricultura em Santa Catarina, resolveram transferir residência para Campina da Lagoa (Paraná) na intenção de continuar na profissão de agricultores, uma vez que, as terras que possuíam no Estado catarinense era diminuta e de relevo acidentado, o que dificultava trabalhar na agricultura. Em Campina da Lagoa residiram alguns meses do ano de 1952. Influenciados  pela propraganda das terras no oeste do Paraná, rumam com a família para Santa Helena Velha.

Nesta localidade adquirem uma colônia de terras (10 alqueires). Aréa plana, que favorecia o manejo do plantar e colher cereais, porém, havia alguns desafios a serem superados, exemplo, derrubar a floresta que havia na propriedade rural, as estradas da época, ficavam praticamente intransponíveis durante os meses de intensas chuvas, porque, formavam imensos lamaçais em seus trajetos, o que dificultava trafegar por estes caminhos, por outro lado, nos meses ensolarados, ocasionavam poeiras, em razão, de ventanias e automotores que passavam por estas estradas.

Naquela época, os agricultores derrubavam as matas, abriam estradas, valendo-se da força dos braços, utilizando machados, traçadores, foices, enxadas, enxadões e picaretas.

Quando alguém da família ficava doente e necessitasse de tratamento médico/hospitalar para curar a enfermidade que contraira, era preciso deslocar à Toledo e/ou a Fóz do Iguaçu, porque, em Santa Helena não dispunha de profissionais de saúde que atendesse os santa-helenenses em suas enfermidades. Inclusive um irmão de Tereza, faleceu em decorrência de ter contraído sarampo logo após a família fixarem residência em Santa Helena Velha e que, segundo Tereza, esta morte teria sido evitada se houvesse atendimento médico em Santa Helena nos primórdios da colonização do município.

Os pais de Tereza Tieschner por serem fervorosos seguidores da religião católica, não mediam esforços para hospedar na residência da família, padres que vinham de Foz do Iguaçu para Santa Helena Velha desempenhar os trabalhos de profissão de fé frente àquela comunidade. Acolhiam os religiosos, porque, na localidade (à época) não existia uma residência construída pela Igreja Catolica com a finalidade de abrigá-los quando estes ali encontravam.

Tereza frequentou os bancos escolares até o terceiro ano primário (atualmente corresponde ao quarto ano do ensino fundamental séries iniciais). Filha de agricultores e, vivendo no campo com os pais, os auxiliavam nos afazeres do campo e nos trabalhos do lar. Disse ela que conheceu pessoas negras em Santa Helena Velha quando tinha uns oito anos de idade, até então, nunca tinha deparado com pessoas de cor.

O primeiro contato com um negro ocorreu na casa da família, no qual ficou assustada e com muito medo desta pessoa, por isso procurou refúgio no interior da moradia. Na sequência, Tereza ficou sabendo através de seus familiares, que esta pessoa comandava o destacamento militar sediado em Santa Helena e era conhecido por “Sargento Preto” pelos moradores do município.

Na ocosião, ele deslocou até a casa da família Tieschner para realizar os levantamentos de praxe em razão do falecimento repentino de André Tieschner (pai de Tereza Tieschner). No ano de 2018, Tereza Tieschner estava visitando o museu administrado pela Itaipu em Foz do Iguaçu, para sua surpresa deparou com um agente que fazia segurança daquele local, e que aparentava ser o “Sargento Preto” que conhecera à décadas em Santa Helena Velha.

Indagado por ela (Tereza), se ele trabalhou em algum momento em Santa Helena, disse que sim e que, comandou na década de 1960 o destacamento militar do exército brasileiro, que havia na sede do município. Continuando a conversa, Tereza perguntou ainda, se o mesmo recordava da morte de André Tieschner na localidade de Santa Helena Velha. Disse que lembrava perfeitamente, e assim expressou, “foi um ataque cardiáco fulminante que ceifou a vida de André”. A entrevistada comentou que ficou admirada com a lúcida memória deste sargento, haja visto que tal acontecimento acima explicitdo ocorreu a 60 (sessenta) anos e ele recordou com total nitidez daquele fato.

Ao finalizar a entrevista, Tereza disse que casou muito jovem, a partir daí, passou a a cuidar dos serviços do lar e prestar serviços gerais em residências do bairro em que morava, como forma de auxiliar no equilíbrio financeiro da família. Trabalhou por muitos anos sem carteira assinada, portanto, não contribuiu com o Instituto Nacional de Seguridade Social - INSS, fato que impossibilita-a, reivindicar aposentadoria. Idosa e sem salário, sobrevive do provento que recebe o esposo, que é um salário minímo.

Vejamos a trajetória histórica narrada por Hermelino Ferreira. Sua família deixou o Rio Grande do Sul (1959) com destino a Linha Dois Irmãos, interior de Santa Helena. Vieram sem um prévio conhecimento do oeste do Paraná, porém, foram convencidos por Mário Andrade, primo segundo da mãe de Hermelino, e que residia nesta região e, falava aos parentes a respeito das riquezas naturais que havia neste lugar.

Transportados do RS por um caminhão, onde trouxeram na viagem alguns utensílios domésticos. Obs. Segundo Hermelino, nesta viagem, quando estavam passando na região de Prudentópolis (PR), depararam com uma camionete que sofrera um acidente. O motorista encontrava dificuldades para recolocar o seu meio de transporte (carro) na estrada para seguir a viagem. Os familiares de Hermelino prestaram socorro a este viajante, em recompensa pela contribuição que recebeu, ele doou diversas “peças” de  mortadela, produto que negociava naquela região do Paraná.

Imediatamente adultos e crianças começaram a degustar o alimento que ganharam do viajante, mas, exageram na quantidade ingeridas, e não demorou em sentir fortes dores estomacais e, para complicar ainda mais a situação do pessoal, as mortadelas estavam a  horas expostas ao calor do sol, o que certamente estavam contaminadas de bactérias.

Resultado dessa alimentação, vômito e desinteria, e os que mais sofreram, as crianças, pois, normalmente são as mais frágeis ao consumir algum tipo de alimento que possam estar infestada de agentes nocivos à saúde dos seres humanos.  

Resolvido os desarranjos intestinais por eles sofridos, continuaram a viagem com destino à Santa Helena. Conseguiram chegar de caminhão ao vilarejo de Mercedes (hoje, município com a mesma nomenclatura), pois, não existia estrada que interligava a região oeste do Paraná no final da década de 1950 que fosse possível trafegar com caminhões e/ou automovéis.

Por conta disso, de Mercedes à Linha Dois Irmãos (SH), tiveram que caminhar a pé em meio às estreitas aberturas na floresta, conhecidas por “picadas”. Residiram por um breve espaço de tempo na Linha Dois Irmãos (SH) e, em razão das dificuldades que ali encontraram  como exemplo, falta de estrada, atendimento médico, escola, igreja, centro de convivência social, resolveram transferir residência para Foz do Iguaçu. Município que permaneceram residindo até o ano de 1962. Neste ano, transferem moradia para Oliveira Castro, (próximo a Guaíra). De Foz do Iguaçu até Porto Mendes, viajaram de barco (Rio Paraná), de Porto Mendes à Oliveira Castro, de trem. Permaneceram um ano em Oliveira Castro (1963), nesta localidade trabalharam de agregado em uma propriedade rural. Retornam à Santa Helena Velha e, adquirem uma colônia de terras.

Pedro Ferreira (genitor de Hermelino), de espírito aventureiro, negocia esta propriedade e compra no Paraguai uma área rural e inicia os trabalhos de preparação das terras para o plantio de lavouras. Mal sabia que tinha adquirido uma área de terras de uma falsa imobiliária no país vizinho (eram viagaristas os corretores e supostos donos da colonizadora). Diante dos documentos oficiais paraguaios apresentados pelo proprietário da área, foram obrigados abandonar o imovél rural, além disso, perderam todo o dinheiro investido na aquisição da referida terra.

Desiludidos com tal situação, regressam ao Brasil através do Porto Franco - PY (Rio Paraná) que interligava Foz Iguaçu e, nesta cidade fixam residência. Obs. Este Porto fica aproximadamente seis quilômetros abaixo da Ponte da Amizade, no entanto, não mais utilizado na atualidade para navegação, afirma Hermelino.

Desprovidos de condições financeiras com a perca do capital investido no Paraguai, se quer conseguiram adquirir uma moradia em Foz do Iguaçu, por isso, foram obrigados alugar uma casa na cidade fronteiriça para abrigar a família. A partir de então, passam a trabalhar em diversas atividades laborais no referido município.

Hermelino Ferreira trabalhou na construção do aeroporto internacional de Foz do Iguaçu pela Empresa Veloso Camargo, de auxiliar de pedreiro na barragem de Itaipu, motorista e guia turístico pela agência de turismo Ortega. Exerceu atividades comerciais autônoma, no qual, com uma Kombi, comprava dos agricultores de Capanema, Santo Antônio do Sudoeste e Barracão: frango, ovos, linguiça e, em troca desses produtos, pagava com óleo comestível, trigo, sabão e azeitona, adquiridos na Argentina.

Ainda segundo Hermelino, disse que, por nove anos, dirigiu caminhão que transportava madeiras da Fazenda Itabo (PY - proprietário Roberto Emílio Dacaschi) até Fóz do Iguaçu. Entre 1986 a 1991, voltou a trabalhar na Itaipu, na terceira fase (conclusão) da obra. Aposentou em 2012 por tempo de serviço pelo INSS - Instituto Nacional de Seguridade Social, com um salário mínimo de aposentadoria. Provento que tens obrigado a continuar trabalhando como forma de melhorar a renda da família, porque, o que recebe de aposentado é pouco para que possam viver dignamente. Atualmente trabalha com carteira assinada prestando serviços de limpeza e manutenção da Igreja Católica do bairro que residem em Foz do Iguaçu.

Hermelino e Tereza uniram em matrimônio no dia 08 de dezembro de 1965 em Santa Helena Velha. Desta união, foram agraciados com as filhas: Odete Ferreira Vaz de Souza; Sandra Ferreira; Luciana Ferreira. Desde 1966 residem em Fóz do Iguaçu, na Vila Brasília, rua Padre Manoel da Nóbrega, 319 (residência própria do casal). No Bairro que o casal reside, Hermelino é conhecido pela alcunha de Lili e Tereza, por Terezinha. 

Odete, profisssão, do Lar, proporcionou aos seus pais, o neto: Matheus e a neta, Giovana Gabriela;

Sandra, profissão, Decoradora (aposentada), proporcionou aos pais a neta: Tatiele Cristina de Souza e o neto, Leonardo de Souza;

Luciana, profissão, Advogada, solteira/sem filho.

Mensagem:

“Agradeço ao casal Hermelino e Tereza, pela oportuna entrevista, no qual relataram os sonhos, bem como, os desafios que seus familiares tiveram de superar no oeste paranaense a partir do instante que saíram de seus Estados de origem (RS/SC) e, paralelamente a este encontro, tive a oportunidade de conhecê-los pessoalmente”. Grato. Prof. João Rosa Correia.








João Rosa Correia