Contando Histórias

10.04.2015

Entrevista com Avelino Webber e Maria Luiza Webber

Na quinta-feira, 19 de março de 2015, o Professor de História João Rosa Correia entrevistou o Sr. Avelino Webber e sua esposa Sra. Maria Luiza Webber na residência do casal localizada na Rua Porto Alegre nº 440, área central de Santa Helena.

Ele nasceu no dia 15 de setembro de 1927 no município de Getúlio Vargas e ela, no mesmo município, no dia 11 de abril de 1930, Rio Grande do Sul. Estudaram até a quarta série do “antigo” primário (atualmente corresponde ao quinto ano) e ambos de origem italiana. Salientou Avelino, somente na adolescência conseguiu falar português fluentemente. Jovem, residindo em Getúlio Vargas, Avelino auxiliava seus pais nos trabalhos de um hotel da família naquela cidade. Além de trabalhar no ramo comercial, os pais de Avelino exerciam a profissão de agricultores, pois eram proprietários de uma área rural no município, no Rio Grande do Sul. A Sra. Maria Webber, ainda jovem, trabalhava nos afazeres do lar (casas de família). Comentou que seu pai, Carlos Dalsolio (italiano) participou da Primeira Guerra Mundial, porém, fugiu do conflito vindo para o Brasil. Em razão do sofrimento em que estava submetido na guerra, ficou surdo.

Sua mãe Malia Mundin e seu pai eram pessoas desprovidas de bens materiais, exemplo: terras, comércio, entre outros. Para alimentar os filhos, os pais de Maria Webber executavam serviços na cidade e no campo em Getúlio Vargas, ora como mensalista e/ou diarista a terceiros. Tal situação obrigou Maria Webber a procurar trabalho ainda menina nas atividades do lar em Getúlio Vargas como meio de auxiliar financeiramente seus genitores e assim amenizar as dificuldades econômicas que passava a família. Disse ainda, “parece que minha profissão seria mesmo no ramo doméstico, pois quando estava estudando no ensino primário a professora convidava para que eu fizesse café aos professores, funcionários e demais colegas e estudantes. Ficava contente com o convite por estar auxiliando a escola nesta atividade”, enalteceu a entrevistada.

Ao continuar relatando sua história, Maria Webber afirma que ainda jovem passou a trabalhar na própria escola que estudou, no setor de serviços gerais, contratada pela APM - Associação de Pais e Mestres, daquela instituição de ensino. Os anos foram passando, Avelino e Maria atingem a maioridade, se conhecem e depois de alguns anos de namoro resolvem unir-se em matrimônio. Ato ocorrido no dia 10 de junho de 1952 no município de Getúlio Vargas. Desta união nasceram 05 filhos: Sadi Webber, Neides Webber, Orlei Webber, Darcílio Webber e Maria Luiza Webber (falecida).

Após o casamento, Maria Webber passou a colaborar com o esposo nos trabalhos do hotel da família em que o marido era um dos responsáveis, no entanto continuou prestando serviços na escola que trabalhava. A respeito da família de Avelino, acrescentou ao dizer que a mesma era constituída de muitos irmãos e os bens materiais de seus pais não seriam suficientes para assegurar a todos eles a sonhada independência econômica se ali permanecessem trabalhando em parceria quando casados. Paralelamente a esta questão, continuou dizendo, a região de Getúlio Vargas no final da década de 1950 encontrava bastante explorada o que dificultava as pessoas de poucos recursos financeiros acumular algum patrimônio que pudesse almejar uma vida com mais conforto. Com isso surgiu a preocupação do casal Avelino/Maria em procurar um local que oferecesse perspectivas de um futuro melhor à família que se iniciava. A oportunidade surgiu através de Orlando Webber (tornaria vice-prefeito de Santa Helena no ano de 1967. Primo terceiro de Avelino Webber que no final da década de 1950 passou a residir na cidade de Santa Helena.

Orlando Webber ao retornar ao município de Getúlio Vargas para visitar parentes e amigos, procurava convencê-los a vir conhecer a região oeste do Paraná. Relatava sobre as terras agricultáveis, planas, de ótima qualidade e dos lotes urbanos existentes em Santa Helena, aliados a preços acessíveis a qualquer pessoa que desejasse adquirir propriedades na cidade que estava iniciando.

Sendo assim, no final do ano de 1960, Avelino desloca-se com uma caravana de gaúchos (sem a família) da cidade de Getúlio Vargas até Santa Helena. Vieram conferir o que falava Orlando Webber a respeito das terras santa-helenenses. Avelino Webber ao chegar a Santa Helena agradou do lugar e de imediato adquiriu da Companhia de Colonização Agrícola Madalozzo dois lotes urbanos no cruzamento da Avenida Rio Grande do Sul com a Rua Porto Alegre. Nestes terrenos, Avelino construiu a residência e logo em seguida, retornou a Getúlio Vargas para buscar a família.

Avelino e família chegaram a Santa Helena no dia 23 de fevereiro de 1961. Uma das dificuldades que aqui tiveram de enfrentar foi a falta de iluminação elétrica. Somente no ano de 1971 a COPEL – Companhia de Energia Elétrica do Paraná passou a fornecer seu produto e serviços ao município santa-helenense. Até então, para iluminar a residência a família Webber recorria ao uso de lampião movido a querosene. Às vezes faltava querosene no comércio local, o que os obrigavam a queimar panos embebidos de banha para clarear a residência.

Em meados da década de 1960, foi instalado um moinho de cereais movido através de um motor a diesel, na Rua Porto Alegre (defronte da atual residência do casal Avelino/Maria Webber). Durante a noite, após desligar as máquinas que movimentava o moinho, o proprietário fornecia energia elétrica aos moradores de Santa Helena. Estes pagavam uma taxa mensal pelo uso da energia. A família Webber beneficiava-se com este tipo de geração de energia.

Outra dificuldade enfrentada pelos primeiros moradores de Santa Helena era a inexistência de atendimento médico e farmacêutico. Ao deparar com uma enfermidade, os santa-helenenses recorriam aos remédios caseiros (as antigas xaropadas) produzidos pela Sra. Maria Alegrete. Os remédios eram feitos à base de mel e hortelã, chá de erva-cidreira. Fabricava também pomadas a base de funcho, entre outros remédios naturais. Ainda de acordo com Maria Webber, no próprio pátio da escola (Marechal Deodoro da Fonseca) plantavam-se várias ervas medicinais e quando estas estavam em condições de fabricar as xaropadas, Maria Alegrete deslocava de sua residência até a instituição de ensino e neste local coordenava os funcionários na preparação de remédios caseiros com as plantas medicinais cultivadas na escola. Maria Webber integrava a equipe que fazia os remédios no recinto escolar. Porém, a maior produção de remédios, ela fabricava na sua própria casa com as ervas que ela cultivava no pátio de sua moradia. Para além do exposto, Maria Alegrette buscava nas florestas de Santa Helena (abundantes na época) raízes, folhas e cascas das árvores que tivesse algum princípio terapêutico que servissem para o tratamento das doenças que acometiam os seres humanos. O auxílio vindo das matas reforçava o “laboratório farmacêutico” da Sra. Maria Alegrette. Ao término da produção dos remédios fabricados em enormes caldeirões, Maria Alegrette com auxílio de amigas, acondicionava-os em vidros devidamente higienizados. Por meio de etiquetas especificava-se a data de fabricação, ervas utilizadas no preparo do produto, qual (is) enfermidade (s) que o remédio poderia combater. Conforme a doença apresentada, Maria Alegrette informava o “paciente” por quantos dias deveria tomar o remédio e a dosagem.

Maria Alegrete trabalhava de forma voluntária nesta atividade social. Os remédios eram entregues gratuitamente (xaropadas) aos santa-helenenses. No entanto, as pessoas ao procurá-la com o objetivo de receber os seus remédios, espontaneamente recompensava-a em dinheiro, por entenderem o quanto seu trabalho contribuía na diminuição do sofrimento físico dos santa-helenenses, enalteceu Maria Webber.

Prosseguiu ela dizendo que, Maria Alegrete, além de fazer o papel de farmacêutica, prática era uma espécie de psicóloga dos santa-helenenses. Sua residência estava sempre aberta a todos. Recebia visitas em sua casa e/ou ao sair para visitar as famílias que residiam em Santa Helena, não só tratava as doenças do corpo dos santa-helenenses, mas procurava aconselhá-los com palavras de otimismo, fé e esperança, recorda Maria Webber. Obs. Pelos serviços prestados na prevenção e tratamento das doenças dos santa-helenenses, Maria Alegrete foi homenageada emprestando seu nome ao Centro de Atendimento de Saúde do Bairro São Luis (Fonte: José Carvalho da Silva, popular Zezinho Português).

Outro desafio enfrentado pelo casal Webber e demais moradores de Santa Helena no início da colonização, eram as estradas de ligação com as demais regiões do oeste paranaense, bem como as estradas do perímetro urbano, pois viravam puro pó quando não chovia e muita lama durante as chuvas. Tal situação dificultava o contato dos santa-helenenses com os demais municípios do oeste paranaense e/ou fora do Estado do Paraná, principalmente nos períodos de intensas chuvas.

Ao fixar residência em Santa Helena, Maria Webber conseguiu emprego na Escola Municipal Marechal Deodoro da Fonseca como a primeira merendeira/cozinheira desta escola, no entanto seu salário era pago pela APM – Associação de Pais e Mestres. Como na época não havia abastecimento de água através da SANEPAR, somente por meio do sistema de poço, Maria Webber retirava água de um que existia no pátio escolar para fazer os alimentos aos educandos e educadores. Quando chovia bastante, e era constante naqueles tempos, os estudantes chegavam à escola normalmente molhados e sujos em razão do barro que formavam nas estradas. Maria Webber num espírito de solidariedade lavava as roupas sujas das crianças na própria escola e a instituição de ensino fornecia a estes educandos vestimentas limpas e enxutas e assim, estudavam com mais comodidade.

Recorda ainda Maria Webber que durante os períodos chuvosos ela retirava o barro que formava na entrada da escola recorrendo a enxadas e de outras ferramentas que facilitasse este trabalho. Através de mais esta ação, os alunos adentravam ao recinto escolar com maior segurança. Maria disse também, que a diretora Sra. Izelda Alegrette não media esforços para abastecer a escola com produtos alimentícios, uma vez que Santa Helena no início da colonização tinha dificuldade financeira para atender satisfatoriamente as necessidades básicas da população. Como a escola faz parte efetiva da comunidade, também sofria da falta de verbas para atender adequadamente os alunos no quesito alimentação. Para contornar esta situação a diretora Izelda Alegrette recorria aos proprietários de açougues de Santa Helena, que doassem ossos de gado, e aos donos de mercados, alimentos que pudessem ser utilizados na merenda escolar. Dois mercadistas que mais contribuíram com a escola: Plínio do Mercado Santa Helena. Ele doava repolho, tomate, entre outras verduras. Outro comerciante que colaborou com a escola foi Henrique Sandman (Padaria Progresso), este por sua vez, sempre que possível, doava pães, bolos e cucas. Doavam alimentos em condições de uso, frisou Maria Webber. Por meio destas e de outras ações, a escola conseguia no dia-a-dia ofertar aos estudantes uma boa alimentação.

Os esforços da direção, professores e funcionários tinham como finalidade, alimentá-los bem, para que ficassem dispostos e atentos, com isso podiam aprender melhor as lições escolares trabalhadas pelos professores. Portanto, as contribuições (doações) alimentícias foram relevantes à escola por enriquecer o cardápio servido aos educandos.

Na incessante busca para reforçar a alimentação escolar, a diretora Izelda Alegrette incentivava os funcionários no cultivo de horta no ambiente educacional. Esta atitude possibilitou o desenvolvimento de uma ampla e diversificada horta no pátio escolar e que Maria Webber auxiliava no plantio e cuidado das verduras. Portanto, Maria Webber dedicou parcela significativa de sua vida trabalhando no setor de alimentação escolar desde o RS e nas escolas da sede do município de Santa Helena pelo qual se aposentou. Além de trabalhar na Escola Municipal Marechal Deodoro da Fonseca, trabalhou também de cozinheira no Colégio Estadual Humberto de Alencar Castelo Branco e Escola Estadual Graciliano Ramos. Disse ainda que apesar dos desafios enfrentados no dia-a-dia ao trabalhar no setor de alimentação escolar nas épocas passadas, como exemplo, a falta de um local apropriado para armazenar os alimentos e os poucos utensílios disponíveis para o uso na cozinha, entre outros. Porém, as dificuldades apresentadas não eram empecilhos suficientes que impossibilitava realização das atividades profissionais de maneira satisfatória aos educandos e educadores. A execução dos trabalhos fazia-se com amor, carinho, alegria e satisfação. O intuito estava voltado cotidianamente em atender bem a todos os integrantes da escola, relembra a Maria Webber.

A respeito do Sr. Avelino, seu trabalho em Santa Helena consistiu na atividade comercial. Por ter alguma experiência nas atividades de comércio hoteleiro no Rio Grande do Sul, ao fixar residência na sede do município santa-helenense abriu um comércio de bar/lanchonete na área central da referida cidade. Recorda Avelino que Santa Helena nas décadas de 1960 e partes da década de 1970 vivia-se um clima de euforia, haja, visto que diariamente inúmeras famílias vinham residir nesta localidade, atraídos pela fertilidade do solo e preços das terras, etc., com isso ocorreu um rápido aumento populacional e o crescimento econômico desta localidade.

Este fato possibilitou ao Sr. Avelino e com o apoio da família, poder atender diariamente no bar/lanchonete agricultores que deslocava de suas terras até a cidade para resolver seus interesses particulares, bem como, trabalhadores do comércio, estudantes, professores, funcionários da subprefeitura, posteriormente prefeitura municipal, corretores de imóveis, enfim, qualquer pessoa que precisasse de uma alimentação, ali estava eles para atendê-los.

Avelino disse também que por 10 anos consecutivos fez uma parceria com a APM e direção da Escola Municipal Marechal Deodoro da Fonseca e assim explorava a cantina escolar desta escola. Com a permissão da municipalidade abriu uma quitanda na atual Praça Antônio Thomé onde vendia frutas: laranja, banana, abacaxi, tangerinas, entre outras. Para vencer as atividades profissionais no qual estavam envolvidos e os afazeres do lar, Avelino/Maria Webber trabalhavam um colaborando para com o outro. Com este espírito de união familiar conseguiram superar os obstáculos da vida e criar os filhos, pelos quais ao tornarem adultos seguiram os caminhos de suas existências, finalizou Avelino e Maria.

Mensagem do Casal Avelino e Maria Weber:

“Ao longo de 54 anos residindo na sede do município sempre tivemos um ótimo relacionamento com todos os santa-helenenses, indiferentemente da posição econômica, social e/ou política da (s) pessoa (s) que aqui mantivemos e que continuamos mantendo contatos. Quando precisamos da prefeitura, APM, dos vizinhos e colegas de trabalho, estes nos socorriam nas nossas necessidades. Por isso sentimos felizes em ter escolhido Santa Helena para morar e criar nossos filhos. Através deste contato fraterno, leal e amigo nunca tivemos vontade de deixar o município, pois a sociedade santa-helenense foi parceira com a família. Nossa gratidão à Santa Helena”.

Meus agradecimentos ao casal Avelino e Maria Webber pela acolhida em sua residência e de relatarem importantes aspectos da história de sua família. Certamente os fatos comentados por eles enriquecerá a historiografia da colonização de Santa Helena. Apesar da idade avançada, o casal consegue demonstrar lucidez e disposição ao descrever sobre a convivência de longo tempo com a comunidade santa-helenense. Ao permitir registrar as suas narrativas históricas, acredito que estão proporcionando a atual e futura geração de Santa Helena, conhecimentos que permite e permitirão entender melhor a formação social e econômica deste município.

Festa de confraternização entre os funcionários e professores da Escola Marechal Deodoro da Fonseca. Década de 1970. Maria Webber é a 2ª da direita (gorro branco) para esquerda da foto. Festa de confraternização entre os funcionários e professores da Escola Marechal Deodoro da Fonseca. Década de 1970. Maria Webber é a 2ª da direita (gorro branco) para esquerda da foto.
Festa de confraternização entre os funcionários do Col. Castelo Branco. Maria Webber é a 4ª pessoa da direita para esquerda da foto. Final da década de 1980. Aniversário Maria Webber. Festa de confraternização entre os funcionários do Col. Castelo Branco. Maria Webber é a 4ª pessoa da direita para esquerda da foto. Final da década de 1980. Aniversário Maria Webber.
Reunião de professores e funcionários da Escola Marechal Deodoro da Fonseca. A Sra. Maria Webber é a que está de gorro branco na cabeça.  Década de 1960. Reunião de professores e funcionários da Escola Marechal Deodoro da Fonseca. A Sra. Maria Webber é a que está de gorro branco na cabeça. Década de 1960.



Encontro festivo de Maria Webber e amigas. Ela é a 2ª da esquerda para direita na fila de baixo. Encontro festivo de Maria Webber e amigas. Ela é a 2ª da esquerda para direita na fila de baixo.
Maria Webber, 1ª da esquerda da foto em pé. Quando recebeu a visita de suas irmãs do RS  em Santa Helena. Década de 1980. Maria Webber, 1ª da esquerda da foto em pé. Quando recebeu a visita de suas irmãs do RS em Santa Helena. Década de 1980.
Avelino e Maria Webber quando completaram 50 anos de casados em 2002. Avelino e Maria Webber quando completaram 50 anos de casados em 2002.
Maria, Avelino Webber e o Prof. João Rosa Correia. Foto 19 de março de 2015. Maria, Avelino Webber e o Prof. João Rosa Correia. Foto 19 de março de 2015.
Casal Avelino e Maria Webber. Foto 19 de março de 2015. Casal Avelino e Maria Webber. Foto 19 de março de 2015.
Encontro entre as amigas de Maria Webber. A mesma é a 3ª da direita para esquerda da foto. Década de 2000. Encontro entre as amigas de Maria Webber. A mesma é a 3ª da direita para esquerda da foto. Década de 2000.
Residência de Avelino e Maria Webber. Localizada à Rua Porto Alegre 440, centro de SH. Nesta casa residem a 23 anos. Residência de Avelino e Maria Webber. Localizada à Rua Porto Alegre 440, centro de SH. Nesta casa residem a 23 anos.

João Rosa Correia