03.09.2008
1ª QUINZENA - AGOSTO 2008
RAUL SEIXAS:
"O rock’n’roll morreu em 1959". Parte II
Segunda parte da entrevista de Raul Seixas à Revista Bizz, em janeiro de 1986.
Chegaram para você e literalmente mandaram embora?
"Literalmente" é choque no saco. Fui torturado mesmo no governo Geisel. Me pegaram lá no Aterro do Flamengo, me botaram uma carapuça e fiquei uns três dia num lugar desconhecido. Aí vieram três pessoas: um bonzinho, outro mais inteligente que faziam as perguntas e um mais "agreste". Depois me colocaram num aeroporto e fui para Greenwich Village (bairro nova-iorquino).
Foi lá que você conheceu John Lennon?
Eu já me correspondia com ele. Eu e o Paulo Coelho (letrista e parceiro de Raul). Ele estava com um movimento chamado New Utopia. Conversamos sobre tudo isto e sobre as grandes figuras do mundo. Ele ficava me perguntando sobre História do Brasil, queria saber quem tinha sido Dom Pedro.
Vocês chegaram a armar alguma coisa?
Não, porque eu tive que ir para a Geórgia. Assim que eu voltei o pessoal do consulado brasileiro veio em casa, dizer descaradamente que "Gita" estava fazendo o maior sucesso, que era para eu voltar, que eu era um patrimônio nacional. Mas eu vi muita coisa lá. Toquei com Jerry Lee Lewis em Memphis, numa boate... Ele me acompanhando no piano e eu cantando "Long Tall Sally" (um dos clássicos de Litlle Richard). Aí os americanos batiam palmas, pediam outra música enquanto eu me dizia: "que diabo estou fazendo aqui, um baiano cantando rock em Memphis, Tennessee", fiquei doido.
Qual seria a banda dos seus sonhos? Vale quem está vivo e quem já morreu...
Os Beatles, não tem papo, eles foram incríveis mesmo. E a banda que acompanhava Elvis em 54/55: Scotty Moore, Bill Black e DJ. Fontana. Bateria, baixo de pau e guitarra...só isso e os caras faziam a festa, incrível.
E o Punk?
Também é moda, nada que atinja os alicerces do sistema. O sistema vai reverter e capitalizar em cima, se é que isso já não aconteceu...
Você sempre teve fama de irresponsável. É uma injustiça?
Eu sou teimoso e todos querem que eu seja certinho. Eu não, sou chato mesmo, "mosca na sopa" até hoje. Sou mais anárquico do que irresponsável, mas sei jogar. Se você mover uma peça errada, dança...é difícil.
E os OVNIS?
Em 73 eu comecei a falar nisso. Aí me encheram tanto que eu parei.
"Ouro de Tolo" aconteceu por causa deles, não?
A música rolou porque eu vi um disco voador. Foi um toque estranho mesmo, me senti impelido. Eu vomitei aquela música, não foi devagar, não. Foi na Barra da Tijuca e durou uns dez minutos. E eu sou cético, agnóstico...
A humanidade evolui ou regride?
Isso é uma pergunta que você faz. Tem um livro meu de metafísica em que eu questiono a tese aristotélica das cinco perguntas básicas: por que, quem, onde, como, qual...Não existem perguntas por que não existem respostas. Não existem respostas porque não existem perguntas. Eu não pergunto mais. As coisas são, nós somos verbos, somos e estamos, é a única coisa que a gente sabe. Conjecturar, quem há de? E é bonito assumir essa coisa de somente ser...está todo mundo perguntando e até hoje ninguém tem resposta.