Esporte | Série B

Sábado, 07 de Setembro de 2024

Dobradinha 017: conheça a receita do sucesso de Novorizontino e Mirassol, os líderes da Série B

Times de cidades pacatas da mesma região do interior de SP têm projetos parecidos e criam competição sadia na ponta da tabela da Segundona

Foi no dia 17 de agosto de 2024 que a liderança da Série B pousou na região noroeste do estado de São Paulo. E não saiu mais de lá. O Mirassol bateu o Ceará na 21ª rodada e assumiu a ponta da Segundona pela primeira vez em sua história. Nas três rodadas seguintes, a dianteira mudou de mãos, mas não de região.

Aproveitando-se do tropeço do rival, o Novorizontino se transformou no novo líder da Série B desde 20 de agosto. Um ponto atrás está o Leão, que é o vice-líder em uma dobradinha inédita dos dois clubes da região de São José do Rio Preto.

A dupla ficou a um ponto do acesso inédito ao Brasileirão no ano passado e, em 2024, aparece mais forte do que nunca. O país pode se surpreender ao ver o sucesso de times que estão sediados nos dois menores municípios entre os 40 clubes das duas primeiras divisões nacionais.

São 38 mil moradores em Novo Horizonte e 63 mil em Mirassol. Somadas, tem 101 mil habitantes que não encheriam um Morumbi e um Maracanã do século passado. As pacatas cidades fazem parte da região de São José do Rio Preto e estão separadas por 100 quilômetros de distância.

A simplicidade da vida no interior de São Paulo é completamente oposta à ambição, estrutura, organização e planejamento de Novorizontino e Mirassol. Mesmo com públicos pequenos, com médias de 2 mil torcedores por jogo, a dupla "da 017" - em alusão ao código de área da região - enfrenta, na mesma divisão, times campeões nacionais e de grandes torcidas.

Outro abismo em relação à maioria dos adversários de Série B é a folha salarial. O próprio técnico do Novorizontino, Eduardo Baptista, citou que o clube paga oito vezes a menos nos salários que o Santos.

Além da folha enxuta, os times também compartilham o bom trabalho nas categorias de base, a longevidade dos treinadores (Mozart e Eduardo Baptista há mais de um ano no cargo) e a assertividade no mercado da bola.

A rivalidade do "Dérbi da Selva" e do "Clássico Tião" é acirrada entre as torcidas, mas é bastante sadia entre as duas gestões.

O ge ouviu um representante de cada time e abordou temas que ajudam a explicar o sucesso de Tigre e Leão. Com a palavra, Júnior Antunes, vice-presidente do Mirassol, e Michel Alves, diretor executivo de futebol do Novorizontino.

Projetos semelhantes

O discurso dos clubes parece até ensaiado. Palavras como "gestão", "seriedade" e "responsabilidade" são algumas das mais ouvidas de lado a lado.

Em ambas as equipes, estes são os pilares do trabalho que vêm sendo desenvolvido nos últimos anos, como explicam os homens fortes por trás do futebol dos dois clubes. Eles admitem, inclusive, a admiração mútua.

– Acho que tem de se valorizar muito o trabalho feito tanto no Novorizontino quanto no Mirassol há um bom tempo. Não levo pelo lado da rivalidade, mas sim como uma referência de estrutura. O Mirassol tem todo o seu investimento, o seu CT e isso para nós é motivo também de reconhecimento. Ter duas equipes no interior de São Paulo se preparando, se projetando para um cenário de competições importantes é um motivo de orgulho para o torcedor. E de referência para o meio do futebol – explica Michel Alves.

– As gestões são semelhantes e sérias. Sempre todas decisões são em prol do clube e principalmente com gestões a longo prazo, além do amor envolvido pelas instituições – acrescenta Júnior Antunes.

Escolha cuidadosa das peças

Não é preciso ser um fanático por futebol para ver rostos conhecidos ao assistir a uma partida que envolve Mirassol ou Novorizontino.

Do lado do primeiro estão nomes como os goleiros Alex Muralha e Vanderlei, o lateral Zeca e o atacante Léo Gamalho. Alguns deles com passagens até por seleção brasileira.

Já entre os que vestem amarelo e preto há o atacante Lucca (ex-Corinthians e Fluminense), o zagueiro César Martins (ex-Flamengo) o goleiro Jordi (ex-Vasco) e, é claro, o técnico Eduardo Baptista, de passagens por Palmeiras, Flu e Athletico Paranaense.

A montagem dos elencos, nos dois clubes, obedece a critérios rigorosos, mas curiosamente distintos. No Mirassol, o "combo" histórico e fisiologia é o que determina a escolha dos reforços.

– O Mirassol é um clube que precisa ser muito seletivo na escolha dos atletas, pois trabalha com um elenco enxuto e, com isso, todos os jogadores são importantes. A escolha é feita sempre em conjunto com a comissão técnica, levando em conta o histórico do jogadores. Contamos com o auxílio da gestão de performance (fisioterapia + fisiologia + nutrição) e conseguimos preservar o físico dos atletas para ter um índice baixo de lesões. Um atleta que tenha como princípio vencer e crescer no futebol vai encontrar no Mirassol o melhor da estrutura física para melhorar sua performance – garante o vice do clube.

Já no Novorizontino, Michel Alves e Eduardo Baptista dão preferência a jogadores que se encaixem no estilo de jogo do treinador. A dupla trabalha em conjunto no clube desde o fim de 2022 e se mostra afinada e certeira tanto na hora de montar um elenco quanto na busca por eventuais peças de reposição.

– Buscamos atletas de acordo com o sistema de jogo da nossa comissão técnica e a maneira que o Eduardo Baptista entende o futebol. Trabalhamos com atletas com esse perfil. Fazemos essa abordagem em uma dinâmica buscando sempre antecipar os movimentos. Ainda assim, temos de 70% a 80% dos atletas com contrato mais longo para manter uma base. Foi o que fizemos em 2023 e, neste ano, muitos jogadores permaneceram. E assim será em 2025, sempre pensando adiante.

E a rivalidade?

Como não poderia deixar de ser com duas equipes próximas em localização, projeto, momento e que disputam as mesmas competições, a rivalidade existe. Tanto é verdade que é comum ver faixas provocativas e constantes reivindicações de "Maior da 017".

Entre as gestões, porém, o clima é amistoso e até mesmo de torcida mútua.

– A rivalidade entre as cidades e as torcidas existe, mas entre as diretorias o clima é de respeito e amizade. Torcemos pelo sucesso do Novorizontino, pois seria fundamental para a região. Além da distância, existe um admiração pelas pessoas que trabalham lá pela seriedade como tratam o futebol. E torcemos para que no final do ano, possamos comemorar juntos os nossos objetivos – diz Júnior Antunes.

O diretor de futebol do Novorizontino acredita ainda que, no atual patamar atingido, o sucesso de uma equipe serve como incentivo para a outra, e prefere deixar o aspecto da rivalidade para o campo.

– São duas equipes que vêm tendo boas performances no campeonato estadual, vêm se preparando de maneira estrutural, com uma gestão profissional e responsável. Acho que um acaba sendo um estímulo para o outro. Não no sentido de rivalizar, pois cada um tem sua maneira de trabalhar e de entender futebol. Mas uma coisa está bem clara: são duas equipes muito organizadas, muito responsáveis em todas as suas ações de ordem financeira, de respeitar os profissionais e valorizar o que está sendo feito – finaliza Michel Alves.

G1