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Segunda-feira, 07 de Outubro de 2024
Como o Fluminense lutou contra o nazismo e ajudou o Brasil na Segunda Guerra Mundial
Doação de um avião, envio de profissionais de enfermagem e cessão de quase mil reservistas para o combate ficaram conhecidos como "esforços de guerra" ligados ao clube
Um dos momentos mais sombrios do século 20, a Segunda Guerra Mundial (1939—1945) ficou marcada pelo combate à ascensão do nazismo e do fascismo. Estima-se que mais de 70 milhões de pessoas morreram no período. O Brasil juntou-se à luta em 1942 e contou com o apoio de instituições empresariais, financeiras e até de um clube de futebol. Sim, o Fluminense contribuiu para o combate numa história que o ge conta nesta reportagem.
Antes, é preciso contextualizar o mundo em 1942. Getúlio Vargas era o presidente do Brasil, no regime ditatorial do Estado Novo. Na ocasião, ele aderiu à Carta do Atlântico, que previa o apoio a qualquer nação da América que fosse atacada. Tal assinatura gerou uma represália: submarinos alemães e italianos afundaram embarcações brasileiras no Oceano Atlântico, gerando enorme pressão popular para que o Brasil aderisse à guerra.
O problema era que o país não tinha infraestrutura industrial, financeira ou médica para intervir num conflito de grande porte. A solução encontrada pelo Governo foi lançar a "Campanha Nacional de Aviação", que tinha o objetivo de angariar doações e materiais que servissem para a compra ou construção de aviões, ampliação de hangares e campos de pouso de aeroclubes. É neste momento que o Fluminense começa a participar da guerra.
O presidente do Tricolor na época, Marcos Carneiro de Mendonça, também era historiador, o que o fez acompanhar de perto o conflito. Ao saber da iniciativa do Governo, enviou uma carta para que os sócios do Fluminense arrecadassem fundos para a compra de um monomotor modelo Fairchild PT-19, que seria doado para a Força Expedicionária Brasileira. Há relatos de que o dinheiro das próprias finanças do Fluminense foi utilizado para aumentar o montante e chegar ao valor necessário.
Outro motivador foi um atleta judeu que defendia o Fluminense. Nascido na Argentina, Adolpho Milan era filho de ucranianos. Também conhecido como "Russo", tornou-se o sétimo maior artilheiro da história do Tricolor com 149 gols e, indiretamente, virou um grande incentivador para que os sócios aderissem à causa contra os nazistas, regime marcado pelo antissemitismo.
Além das doações para a compra do “Pax”, o Fluminense organizou eventos esportivos de diversas modalidades para a arrecadação de fundos, como a competição hípica ocorrida no Estádio das Laranjeiras, torneios universitários e até competições consideradas "fora do normal" para os jornais da época.
Ao todo, estima-se que o Fluminense arrecadou 155 mil cruzeiros para a compra, valor considerado relevante para a época. O avião foi criado por Santos Dumont, o 11º sócio da história tricolor.
A entrega da aeronave, batizada de Coelho Netto, em homenagem póstuma ao escritor, patrono e sócio do clube, foi feita nas Laranjeiras, em uma cerimônia realizada no dia 11 de outubro, antes de um clássico entre Fluminense e Flamengo, pelo Campeonato Carioca daquele ano. O jogo terminou empatado por 1 a 1.
Contribuição vai além
Além da doação do avião, o Fluminense disponibilizou — e sediou — cursos de enfermagem nas instalações das Laranjeiras para capacitar profissionais que lutariam na Itália. Mais de 100 profissionais capacitados saíram de lá para auxiliar as tropas brasileiras na Itália.
O estande de tiro também foi utilizado para treinamentos dos militares que viajaram para o combate. O Fluminense cedeu Laranjeiras para eventos de "esforço de guerra" e ampliou a sua Escola de Instrução Militar. De 1937 a 1945, foram 813 reservistas cedidos ao Exército Brasileiro. Durante a guerra, o clube estabeleceu a obrigatoriedade da leitura de um “Prefixo de Guerra” em todos os eventos esportivos por ele organizados.
Em 2015, a Comunidade Judaica prestou uma homenagem ao Fluminense. O clube recebeu uma placa de reconhecimento pelo combate ao nazismo na Segunda Guerra Mundial. Um chanukiá, candelabro de nove braços, ficou exposto na sede por duas semanas.
Em 2022, o Tricolor entrou em campo com a Estrela de Davi no uniforme, em jogo contra o Goiás que ocorreu na mesma data da “Noite dos Cristais” (ou “Kristallnacht”), que em 1938 marcou uma ocasião de extrema violência contra judeus na Europa. Além de muitas mortes e sinagogas queimadas, escolas judaicas foram destruídas e milhares de pessoas enviadas aos campos de concentração, iniciando uma intensa onda de violência antissemita em países como Alemanha, Áustria e Tchecoslováquia.
G1