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Quarta-feira, 19 de Novembro de 2025

Acreditei por anos que eu era minha irmã morta ressuscitada'

Gail Gallant cresceu acreditando que era fruto de um milagre: ela era a ressurreição da irmã morta em um acidente de carro, havia dito sua mãe.

Não era à toa que as duas tinham o mesmo nome.

"Eu tinha morrido, passado supostamente nove meses no céu e depois voltado para cá", disse.
Em entrevista ao programa Outlook, da BBC, Gail contou o peso que isso teve em sua vida — e como foi capaz de se libertar do fantasma da irmã.

Em julho de 1955, a família Gallant foi vítima de um trágico acidente de carro no Canadá.

A caminho da casa de familiares, o carro em que estavam foi atingido por um caminhão.

Todos os membros da família ficaram feridos — e a filha mais nova, Gail, com apenas cinco meses, faleceu algumas semanas depois no hospital.

Maria Gallant ficou completamente devastada com a perda da filha, e o médico sugeriu que ter outro bebê poderia aliviar sua dor.

Pouco tempo depois, ela estava grávida de novo.

Católica fervorosa, se convenceu imediatamente que a gestação seria uma forma de Deus atender suas preces e trazer sua filha de volta.

Quando deu à luz uma menina, praticamente idêntica ao bebê que havia perdido, teve certeza que se tratava de um milagre.

"Ela não queria ter outro filho, ela só queria aquele bebê de volta. Ela acreditava que Gail estava literalmente na sua barriga, crescendo novamente", diz a hoje escritora Gail Gallant, que veio ao mundo em um parto milagrosamente indolor. Segundo a minha mãe, eu tinha exatamente o mesmo peso, cabelos escuros, o mesmo rosto", conta.

Maria decidiu então chamá-la de Gail, mesmo nome da filha que havia perdido.

E aos quatro anos, Gail se sentiu ciente que havia "renascido".

"Acho que foi a primeira vez que entendi que, segundo a minha mãe, meu nascimento tinha sido um milagre, que eu tinha morrido, passado supostamente nove meses no céu e depois voltado para cá."
Inicialmente, Gail não teve dúvida de que era a ressurreição da irmã — e se entusiasmou com o status de "criança milagrosa".

"Minha primeira reação foi uma espécie de euforia, de orgulho, de felicidade. Tive a sensação de ter sido escolhida, me senti incrivelmente sortuda. Muito especial. E a pessoa mais importante da minha vida me via assim."

Ela conta que isso criou um vínculo especial entre as duas.

"Acabei com uma das coisas mais horríveis que uma pessoa pode passar... que é perder um filho. Meu nascimento levou essa dor embora por um tempo. Eu tinha outras duas irmãs, mas sabia que era a favorita, que era especial", recorda.

Por ser uma "criança milagrosa", Gail se sentia predestinada a fazer um bem maior pela humanidade — e chegou a pensar, inclusive, que se tornaria santa ou freira.

Mas essa convicção não durou muito tempo.

"Acho que [começou a perder força] à medida que percebia que não era perfeita. De alguma forma, senti que não poderia corresponder às expectativas que eu achava que seriam razoáveis ​​para alguém que havia ressuscitado dos mortos. Tinha de haver algum propósito na minha vida. E eu não me sentia a altura disso."