Internacionais | De olho no petróleo
Sábado, 20 de Dezembro de 2025
Petróleo, China, Doutrina Monroe: o que está por trás da ofensiva de Trump na Venezuela
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tem afirmado que não descarta uma intervenção militar na Venezuela, governada por Nicolás Maduro. Nos últimos meses, Washington intensificou operações contra embarcações no Caribe e no Pacífico, reforçando o cerco ao país sul-americano.
Para justificar as ações militares e a pressão econômica, o governo americano alega combater o narcotráfico e rotas de drogas associadas a grupos criminosos ligados à Venezuela. Além disso, descreve Maduro como líder de um regime corrupto e diz agir por questões de segurança regional.
Autoridades dos EUA aplicaram medidas diretamente a familiares de Maduro, ampliaram sanções e promoveram um bloqueio total a navios petroleiros ligados ao país sul-americano — escalando a pressão política e econômica sobre Caracas. Também houve apreensão de embarcações.
Em resposta, o presidente venezuelano classificou as ações como tentativa de golpe e ameaça à soberania, chamando as interceptações de “roubo descarado” e “pirataria naval criminosa”. Ele ainda acusa Washington de usar o combate às drogas como pretexto para forçar sua saída do poder.
Mas o que está, de fato, por trás da ofensiva dos EUA? Para especialistas ouvidos pelo g1, os interesses vão muito além do combate ao tráfico e incluem fatores econômicos e geopolíticos, como o interesse pelo petróleo e a relação da Venezuela com a China — principal rival de Trump.
De olho no petróleo
A Venezuela concentra a maior reserva comprovada de petróleo do planeta, com capacidade de aproximadamente 303 bilhões de barris — ou 17% do volume conhecido —, segundo a Energy Information Administration (EIA), órgão oficial de estatísticas energéticas dos EUA.
Esse volume coloca o país à frente de gigantes como Arábia Saudita (267 bilhões) e Irã (209 bilhões), com ampla margem. Grande parte do petróleo venezuelano, porém, é extra-pesado, o que exige tecnologia sofisticada e investimentos elevados para extração.
Na prática, o potencial é enorme, mas segue subaproveitado devido à infraestrutura precária e às sanções internacionais que limitam operações e acesso a capital.
Nesse contexto, há um claro interesse dos EUA. Segundo a EIA, o petróleo pesado da Venezuela "é bem adequado às refinarias norte-americanas, especialmente às localizadas ao longo da Costa do Golfo".
O jornal americano "The New York Times", por exemplo, afirmou que a commodity é prioridade na ofensiva contra o governo de Nicolás Maduro. Segundo a publicação, Washington tem feito negociações secretas com Caracas, justamente com foco no petróleo.
Para Marcos Sorrilha, professor de história dos EUA na Unesp Franca, o presidente norte-americano tem interesse na produção venezuelana por um motivo principal: reduzir preços internos e, assim, aliviar o custo de vida no país.
"O petróleo venezuelano seria uma estratégia de barateamento do preço do combustível para os americanos. É algo que está nas expectativas de Donald Trump", diz.
Nesse contexto, o republicano atinge dois objetivos simultaneamente: ao buscar favorecer a economia dos EUA, também pressiona a produção e as exportações de petróleo da Venezuela — setor central para a economia do país e para a sustentação do governo de Nicolás Maduro.
Os efeitos iniciais já começaram a aparecer nesta semana. Reportagem da Bloomberg News indicou que Caracas enfrenta falta de capacidade para armazenar petróleo, em meio a medidas de Washington para impedir que embarcações atraquem ou deixem portos venezuelanos.
Proximidade com a China
Antes das amplas sanções econômicas impostas pelos EUA à Venezuela, em 2019, os norte-americanos eram os maiores importadores do petróleo bruto do país. O restante das exportações tinha como principais destinos a Índia, a China e a Europa.
Após as sanções, grande parte das vendas externas passou a ocorrer por meio de acordos de petróleo em troca de empréstimos, usados para quitar dívidas. Nesse arranjo, a China disparou sua participação e desempenha papel central.
"A Venezuela mantém uma relação cooperativa com a China em áreas muito críticas, como petróleo e mineração", destaca Carolina Moehlecke, coordenadora do mestrado profissional em Relações Internacionais da FGV.
A especialista reforça que o gigante asiático, principal adversário comercial dos EUA, tem emprestado dinheiro para a Venezuela utilizando embarques de petróleo como garantia.
Com isso, grande parte das exportações venezuelanas foi destinada à China. Por meio dos acordos, o país asiático já concedeu quase US$ 50 bilhões em empréstimos ao longo da última década, em troca de petróleo bruto.
Segundo o relatório mais recente da Energy Information Administration, a China recebeu 68% das exportações de petróleo bruto da Venezuela apenas em 2023.
G1








