Esporte | Entrevista
Sexta-feira, 31 de Outubro de 2025
De volta ao Grêmio, Arthur repassa anos na Europa, se impressiona com nível no Brasil e evita cravar futuro
Por Eduardo Moura e Fernando Becker — Porto Alegre
Com a mesma naturalidade com que gira sobre os marcadores no meio-campo, Arthur repassa a passagem pelo futebol europeu e avalia sua nova fase no Grêmio. O volante recebeu o ge no CT Luiz Carvalho e, de maneira serena e madura, revisitou o passado recente, se mostrou impressionado com o nível atual do futebol brasileiro e disse que seu momento no Tricolor é melhor do que o esperado.
O volante vê os anos entre Barcelona, Juventus, Liverpool, Fiorentina e Girona como positivos. Acredita que absorveu o profissionalismo ao compartilhar vestiários com grandes nomes como Messi e Cristiano Ronaldo, entre outros, e evoluiu para ser o jogador que é hoje.
Atualmente, está com mais massa muscular e percentual de gordura menor, frutos também de um trabalho complementar feito fora do clube. Aliás, afirmou que o futebol brasileiro diminuiu a diferença para o nível das ligas europeias. O aumento de intensidade o faz chegar a 10 km ou 11 km percorridos por partida, enquanto fazia de 7 km a 8 km antes da saída em 2018.
Além disso, o volante gremista evitou projetar se fica ou não ao final do empréstimo da Juventus, em junho do ano que vem, e valorizou o momento vivido com a camisa do Grêmio. O foco, garante, está em desfrutar o presente e, se tudo der certo, estar na Copa do Mundo 2026.
– Acho que todo mundo sabe o carinho que eu tenho pelo Grêmio. Estou muito feliz aqui. Está sendo melhor do que eu esperava. Estou muito focado e com a mentalidade no agora. Todo mundo sabe a minha felicidade de poder estar aqui no Grêmio. Mas as coisas mudam muito rápido. Não depende só de mim – disse Arthur.
Confira trechos da entrevista:
ge - Você chegou ao Grêmio e rapidamente engatou uma sequência de jogos. Como avalia o seu momento atual?
Arthur: Muito feliz pelo meu momento. Estava vindo de uma pré-temporada, ainda não tinha feito jogo oficial, e cheguei aqui na metade do campeonato, o pessoal com outro ritmo de jogo, né? Mas bem feliz pela adaptação, meus companheiros me ajudaram muito nesse processo, comissão técnica também, todo o estafe, só tenho que agradecer a eles por todo o suporte que eu tenho recebido. Muito feliz pelo meu momento, acho que estou em uma evolução. Seguir trabalhando.
O fato de o Grêmio disputar apenas o Campeonato Brasileiro, com jogos mais espaçados, ajuda na recuperação?
Exatamente. Isso também conta muito, faz muita diferença, porque a gente sabe que... Ainda mais no Brasil, que as viagens são muito longas, né? Então você não tem tanto tempo de recuperar. E acho que eu tive um pouco de sorte também nisso, que os jogos estão sendo mais espaçados. Digamos assim, então, tem me ajudado também nisso. Para focar bastante na recuperação.
Por que você acha que dá tão certo aqui no Grêmio? Não que não tenha dado certo em outros lugares, mas parece que tem uma sinergia diferente. Uma química entre você e o clube.
Cara, é uma relação, assim, de muitos anos, né? Foi o clube que me formou como jogador e pessoa. Cheguei aos 13, 14 anos aqui com o sonho de virar jogador profissional e poder realizar esse sonho com essa camisa é algo muito especial. Porque sou muito grato ao Grêmio. Me formou como pessoa, me deu alimentação, moradia, educação. É um sentimento diferente, é especial. De afeto mesmo, de amor. E também agradecer sempre muito a torcida também, porque desde os meus primeiros minutos, foram eles que sempre me apoiaram também. Isso conta muito para o jogador dentro de campo. Dá muita confiança, o entusiasmo é outro. Cara, sou muito grato ao Grêmio, a todos que me ajudaram e muito, muito feliz por estar aqui de volta.
A sua estreia no Grêmio completou 10 anos esse ano. Foi no Gauchão 2015, justamente com o Felipão (hoje coordenador técnico).
Como eu falei, é um momento muito feliz assim na minha carreira, tanto profissional como pessoal, porque quando se fala de Grêmio, entra a parte pessoal também, fui criado aqui, tenho muitos amigos ainda que estão aqui. Então reencontrar essas pessoas, ainda mais essas pessoas que te ajudaram, né? Foi o Felipão que me subiu para o profissional, que me deu a oportunidade de fazer meus primeiros minutos como profissional e poder reencontrá-lo aqui, começar a trabalhar com ele em outro cargo, outra função, mas o carinho segue o mesmo. Muito feliz em poder reencontrar.
Você entrou no time e foi nítida a melhora da equipe. Dá para dizer que o Grêmio estava precisando do Arthur e o Arthur do Grêmio?
Eu acho que não. O Grêmio é muito grande para ser dependente de um jogador só. E é coletivo, são 11 pessoas que entram em campo. Eu acho que um só jogador não vai ser a chave principal de uma equipe. Eu acho que a chave principal da equipe é o comprometimento dos jogadores, o trabalho. Desde quando eu cheguei, eu sinto uma evolução no trabalho, cada um se dedicando ao máximo. Acho que esse é o nosso ponto forte.
Estou em um grande momento, estou muito feliz com as minhas atuações, mas também todo o time. Todo o time tem evoluído. Trabalhado cada vez mais para tentar continuar nessa performance. Estamos mais entrosados também com o tempo. Entraram jogadores novos. Willian, Marcos Rocha, Carlos Vinícius. Enfim, acho que todos também chegaram para somar. O caminho é esse, é o trabalho coletivo.
Fala-se que o Grêmio é diferente quando joga o Arthur e quando não joga. Como você recebe isso?
Eu fico feliz porque é uma forma positiva, é claro, eu enfrento isso como elogios, mas ao mesmo tempo é muito perigoso. Quando você recebe elogios assim, a tendência é você abaixar o nível, achar que já não precisa trabalhar mais para conquistar seus objetivos. Eu sei que no fundo não é a verdade, porque como eu falei, são 11 jogadores dentro do campo, é um jogo coletivo, mas ao mesmo tempo fico muito feliz. Mas não pode abaixar a cabeça, não pode achar que é melhor que ninguém, é seguir trabalhando para continuar entregando dentro de campo.
Você já disputou alguns jogos desde que retornou ao Brasil. Como avalia o futebol brasileiro após esses anos na Europa?
Ao meu ver, aumentou bastante o nível técnico. Sempre foi uma questão muito boa do futebol brasileiro, porque sempre as pessoas de fora falavam que o nível técnico no Brasil realmente é muito bom, só que faltava um pouco de intensidade. Na minha volta, mudou completamente. Minha opinião e também pelos dados. Hoje em dia é tudo com GPS, você é mapeado dentro de campo, os dados falam por si só. É um fato, aumentou muito a questão física, seja de sprint em longa distância, intensidade, em quilômetros por partida. Esse é o futuro do futebol.
Cada vez o futebol fica um pouco mais físico e, como o futebol brasileiro sempre teve a parte técnica muito boa, então acho que como já está agregando essa parte física, só tem a evoluir. Intensidade e qualidade, acho que aumentou. Tanto a qualidade, acho que chegaram muitos jogadores também com muito nível técnico, que jogaram muito tempo fora e dá uma qualidade a mais, porque são grandes jogadores. E a questão física também aumentou muito.
O nível está mais próximo do que tem lá fora?
Sim, sim. A gente teve a prova no Mundial de Clubes, né? Os times brasileiros fazendo boas campanhas, não é da boca para fora, para puxar o saco de ninguém. É um fato, estão aí os dados. Aumentou bastante tanto o nível técnico quanto o físico.
Você também hoje é um jogador diferente daquele que saiu daqui em 2018. Qual foi a principal mudança?
Acho que o profissionalismo. Eu entendi que você pode ter muito talento, mas sem trabalho você não chega muito longe. Quem sabe durante o caminho você encontra adversidades, aí o trabalho vai te dar um sustento e se você não tiver feito esse trabalho antes, é complicado.
Tive a grande sorte de estar e de poder ter jogado em grandes clubes, com grandes atletas, então aprendi muito com eles, muito mesmo. E essa questão do profissionalismo eu acho que foi a chave. Quanto melhor era o cara, mais títulos tinha ganhado, esse cara era o que mais trabalhava. Isso me chamou muita atenção quando eu fui para fora. Também conversando com eles, fiz grandes amizades, todos batem na mesma tecla, que é o trabalho, é o comprometimento, é o profissionalismo, por mais que você seja muito bom, muito técnico, mas sem o trabalho não vai chegar muito longe.
Essa experiência é o que faz hoje você treinar também nos momentos fora do clube? Leva você a se preparar melhor do que antes?
Sim, acho que também tudo que é excessivo não é bom, não é saudável. É encontrar o meio termo. Eu me sinto bem fazendo o meu termo. O meu trabalho também, obviamente, o principal é o Grêmio, mas eu tenho um cuidado fora também. Até o descanso fora é um trabalho, quem sabe descansar mais. Mas isso varia de cada um, acho que cada um tem que saber o seu bem-estar, o que faz ficar bem, seja o descanso, seja um complementinho a mais no final do treino, pode ser até aqui no CT, não precisa ser em casa. Encontrar esse equilíbrio. Sempre a preocupação maior vai ser trabalhar no Grêmio, porque tem profissionais qualificados para isso e nos dá todas as estruturas, todas as possibilidades de fazer um bom trabalho aqui. Mas tenho esse hábito hoje de ter meu estafe também fora do Grêmio para fazer um complemento do que eu faço aqui no Grêmio.
O Braithwaite antes de se machucar também fazia esse tipo de trabalho. É uma mentalidade europeia que você adquiriu?
Muitos fazem, mas muitos também não fazem, então eu não vou julgar falando que é o certo fazer e o errado não fazer. Como eu falei, é o que cada um se sente confortável, o que cada um se sinta bem. Obviamente sempre o principal vai ser no seu clube, porque é o clube que você é funcionário, você tem que chegar aqui nas melhores condições. E o clube, o Grêmio falando especificamente, dá essa oportunidade de fazer todo o trabalho que você precisa aqui. Cada um vai entender o seu corpo, mas isso é questão de maturidade, de tempo também, você vai aprendendo muito. E se você acha que é importante fazer fora, obviamente com o acompanhamento, a supervisão do clube, eu acho válido.
Você falou que voltar a ser convocado para a Seleção é um sonho. Disputar a Copa do Mundo de 2026 é um objetivo seu?
É um sonho, é um objetivo, eu acho que depende muito de mim, de entrar em campo e dar o meu melhor. Por isso que eu bato tanto na tecla do trabalho, quando eu entrar dentro de campo, eu quero estar o melhor fisicamente possível, o melhor mentalmente possível, para entregar o meu melhor rendimento. E, se acontecer, eu vou ficar muito feliz, vai ser o trabalho sendo premiado. Se não acontecer, eu vou estar tranquilo também, porque eu dei o meu melhor, e quem sabe tinha outras pessoas que mereceram mais. Mas eu dei o meu melhor. Acho que eu estou com essa mentalidade.
Ancelotti não te ligou ainda? Você veio do futebol italiano...
Não! Poderia, né, me ligar, me mandar uma mensagem, que seja. Já enfrentei ele algumas vezes também. É um grande treinador, o que falar? Acho que é um treinador digno de seleção brasileira, pela grandeza, tanto da seleção brasileira quanto dele. É um cara multicampeão, acho que ganhou tudo na carreira, tudo que disputou. Só tenho elogios para ele e espero essa mensagem, se Deus quiser (risos).
Como avalia a passagem europeia? Foi tudo o que tu gostaria? Fica satisfeito olhando para os clubes que defendeu? Como é que tu olha para esse passado recente?
Foram muitas fases. Eu avalio, de forma geral, uma passagem muito positiva pelos clubes que eu joguei, pelos títulos que eu conquistei também, a gente sabe que não é fácil, ainda mais nesses clubes que a concorrência é muito grande.
Obviamente, tive momentos não tão bons, alguns momentos de lesões que me atrapalharam muito, mas acho que dei a volta por cima, estou bem recuperado. Saí nessas duas últimas temporadas fazendo boas campanhas, jogando bastante jogos. O que me faltou em algumas outras (equipes), quem sabe, foi um pouco mais de minutos, mas faço uma avaliação muito positiva.
Como eu falei, joguei em grandes clubes, a gente sabe o quanto isso é difícil, conquistei títulos, que também a gente sabe o quanto é difícil, e aprendi muito. Acho que o principal dessa passagem é a minha evolução. Hoje eu me sinto muito melhor, por exemplo, de quando eu cheguei em 2018 ao Barcelona. Hoje eu me sinto muito mais maduro, entendo o jogo em si muito melhor que antes, fisicamente nem se fala, estou muito melhor. Acho que é uma avaliação bastante positiva, fico muito feliz por isso.
Qual a maior dificuldade que viveu lá? Foi aquela lesão mais grave no Liverpool?
Foi, eu acho que foi. Minha primeira lesão muscular. Nunca tinha tido lesão muscular e logo quando eu chego no Liverpool, na primeira semana de treino, que você estava na adaptação, já tinha estreado, feito alguns minutos e, cara, em um lance bobo assim, dando um passe de cinco metros. Rompi o quadríceps. Foi uma lesão muito dura, tive que fazer cirurgia e, como foi minha primeira lesão muscular, eu não sabia muito bem, não entendia muito bem, e sempre que é muscular é um pouco complicado. Porque você acha que está bem na recuperação, mas precisa respeitar os tempos. Pelo momento também, tinha acabado de chegar ao Liverpool, estava entusiasmado, já tinha feito a estreia, e aí você tem essa lesão e fica cinco meses fora, é complicado. Mas aprendi também com a lesão.
Você teve o privilégio de jogar com Messi e Cristiano Ronaldo. Tem algo neles que mais chamou a atenção?
Eu também vejo como um privilégio, porque são dois ídolos. São dois ídolos, e, cara, o que me chamou a atenção é o profissionalismo dos dois. Já ganharam tudo o que poderiam ganhar, não precisam demonstrar mais nada para ninguém, e você vê os caras, são os primeiros a chegar no treino, se está chovendo, se está sol, se está nevando, seja o que for, eles vão estar dentro de campo trabalhando, não gostam de perder no par ou ímpar. Se isso não mexer com você, se você não aprender ao lado desses caras, você não vai aprender em lugar nenhum. Agradecer a eles por todo o carinho que me deram, fiz grandes amizades com os dois, sempre tive boa relação. Foi um privilégio e aprendi muito ao lado desses caras.
Em uma resposta anterior você citou as saídas nas últimas duas temporadas. Esperava ter mudado esse status com a Juventus? De ser emprestado?
Eu acho que hoje eu aprendi a focar muito em mim. Eu sempre vou dar o meu melhor. Fui em um momento também complicado para a Fiorentina, que estava há algum tempo sem jogar por lesão, mas fui para a Fiorentina, fiz todos os jogos da temporada, que fiquei muito feliz com o meu rendimento, tanto físico quanto técnico. Chegamos à final da Conference League. Depois vou para o Girona, faço boas atuações e não tive tanta oportunidade na Juventus. Mas é normal, é do futebol, a gente sabe que a concorrência é muito grande. Saí de lá com a consciência tranquila, de cabeça erguida, que dei o meu melhor. Futebol é assim, talvez não cheguei à oportunidade, não tive tanta oportunidade, ou outro mereceu mais do que eu. Encaro numa boa.
O teu empréstimo ao Grêmio vai até o meio do ano que vem. Esse a possibilidade de ficar mais tempo? Tem vontade de permanecer aqui?
Outra coisa que eu aprendi com futebol é que a gente não pode fazer planos assim, muito distantes, porque o futebol é muito rápido. Hoje, tudo muda muito rápido, seja para o bem, seja para o mal. Então, se tem uma coisa que eu aprendi é me concentrar no momento. Estou muito focado, assim, aqui e com a mentalidade no agora. No agora, o próximo jogo já é o Corinthians, então vai ser o jogo mais importante da temporada. Porque também não depende só de mim, né? Primeiro que as coisas mudam muito rápido no futebol. E segundo que não depende só de mim.
Sou muito grato à Juventus também por ter me liberado por empréstimo ao Grêmio. Eles sabiam o quanto eu queria estar aqui. Com as portas abertas, sempre me receberam muito bem. Mas nessa questão eu não penso muito. Eu acho que não é uma coisa que vai me ajudar. Eu penso, tento me centralizar, me focar no agora, no que eu posso fazer agora e realmente o que vai me ajudar, que é pensar no próximo jogo.
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