O Andarilho

06.12.2011

“WELCOME TO EGYPT”

“Welcome to Egypt” é o que dizem logo na entrada do país. Olham seu visto, olham você e, com um sorriso, carimbam seu passaporte. Simples assim. Bem vindo ao Egito nas ruas lhe dizem. Alguns apenas para começar uma conversa e vender-lhe algo mas geralmente é uma saudação genuína que faz com que você comece a relaxar e amar desde o primeiro dia o país.

 

Cheguei aqui assistindo notícias nos televisores dos aeroportos mostrando um país em uma verdadeira guerra civil com pessoas morrendo e outras atirando pedras em carros blindados do exército. Pensava se não seria melhor ficar tranquilo e seguro na minha prisão do Chade mas, naqueles dias, eu estava tão feliz com minha liberdade que o que me esperava no Cairo não me assustava nem um pouco.

 

Como se os 7 dias detido não tivessem me dado nenhum juízo, visitar a praza Tahrir, centro da revolução por democracia egípcia, foi uma das primeiras coisas que eu fiz após achar um bom albergue e uma boa cama para dormir. Por incrível que pareça, não conseguia dormir naquela cama luxuosa. Ironicamente sentia falta dos meus pedaços de papelão, saco de dormir e mosquiteiro armados no pátio da delegacia da capital do Chade.

 

Saí então para caminhar pela cidade e tentar entender o que estava acontecendo no país. Encontrei milhares de pessoas naquela manhã de domingo conversando sobre política na praça que mostrava sinais de estar sendo ocupada já por vários dias. Estavam todos lá, enviando uma mensagem clara ao exército, que tomou o poder após a derrubada de Hosni Mubarak, que eles estavam falando sério quando pediam por democracia.

 

Passei os primeiros dias aqui no Cairo recuperando-me dos últimos 4 meses de viagens. A passagem pelo sul do deserto do Sahara acabou sendo tão intensa que ao lembrar-me de apenas alguns detalhes, um inexplicável cansaço tomou conta do meu corpo e eu resolvi aceitar meus limites. Passava horas apenas caminhando pelas ruas da cidade, provando diferentes comidas, conversando com pessoas, tentando achar o menor preço para tomar um chá nas inúmeras cafeterias da cidade.

 

Os cafés são uma verdadeira sensação aqui no Egito. Homens passam várias horas do dia fumando shisha (mais conhecida por narguile no Brasil). É um aparato meio difícil de explicar e não tem como entender seu funcionamento apenas olhando. Experimentá-la faz parte da viagem e você fica curioso para entender o motivo de tanta concentração nos rostos dos senhores que se espalham pelas calçadas da cidade. É até uma espécie de meditação. Algumas brasas são colocadas sobre uma mistura de tabaco e frutas secas. Com um tubo você aspira o ar que passa pelas brasas queimando o tabaco. A fumaça passa por um recipiente contendo água que a refresca e umidifica chegando finalmente a sua boca sendo espalhada após numa nuvem densa e perfumada. A cidade tem muitos cheiros e esse é um dos mais constantes.

 

Viajar pelo Egito faz com que você se arrependa de não ter se dedicado mais às aulas de história durante a sua graduação. É um verdadeiro curso intensivo e cada dia você se impressiona com o pouco que sabe sobre esses mais de 5 mil anos que acabaram servindo de base para praticamente todas as civilizações modernas. Entre apenas algumas dessas coisas que vocês deveriam ver antes de morrer, eu recomendo visitar a exposição do tesouro de Tutankamom no museu nacional do Egito e, é claro, o maior Lego do mundo, as pirâmides de Quéops, Quéfrem e Miquerinos.

 

Me impressionou realmente ver toda a coleção de joias e tesouros encontrados na tumba desse jovem faraó. Tudo é feito com tamanha precisão e luxuosidade que fazem com que o visitante gaste a maior parte do tempo apenas visitando essa sala (apesar dos grupos de japoneses verem tudo isso em apenas 5 minutos). Sua múmia foi encontrada dentro de uma sequência de 4 caixas decoradas e 3 sarcófagos, um dentro do outro, parecido com aquelas matrioskas russas.

 

Além disso, visitar a cidade do Cairo é também perder-se na história das religiões. Milhares de mesquitas muçulmanas com seus belos minaretes espalham-se por toda a cidade. Quando é a hora do Adhan (hora da oração), um fantástico som vindo da misturas de todas essas mesquitas toma conta da cidade e parece até que o tempo para por alguns segundos.

 

Tem também igrejas antigas da época dos romanos e que são mantidas ainda hoje por uma minoria de seguidores da Igreja Ortodoxa Copta, a igreja egípcia que possui seu próprio papa. Ela foi fundada pelo apóstolo São Marcos e conta hoje com cerca de 10% da população nacional. São devotos também do São Jorge e é possível ver inúmeras esculturas e ilustrações desse santo e mártir que segundo a lenda nasceu na Capadócia (Turquia) e que morreu defendendo sua crença em Jesus Cristo. Uma das ilustrações chamou minha atenção pois eu sempre havia visto o herói em seu cavalo branco usando uma armadura medieval matando o dragão. Nessa ilustração ele está trajando roupas militares romanas, o que faz mais sentido já que ele era uma soldado romano na época de 300 D.C.

 

Assisti também um espetáculo de dança de membros de uma facção do islã chamados de sufistas. Eles possuem uma maneira mais mística de interpretar o Corão e utilizam música e dança como forma de devoção e meditação. Ficam girando por cerca de meia hora e quando param não demonstram nenhum desequilíbrio. Visitei também um cemitério muito interessante no qual várias famílias moram entre suas sepulturas que mais parecem casas sem teto. Viajar pelo Egito é viajar pela história. Estou ansioso para ver o resto.

 

Abraços  e até a semana que vem.

Cemitério “sem teto” na cidade do Cairo.

Pirâmides de Gizé: Quéops, Quéfrem e Miquerinos.

Dança sufista.

Edson Walker