O Andarilho

26.08.2011

RABAT, A CAPITAL DO MARROCOS

O maior medo de um andarilho é logicamente a possibilidade de apego à terra e aos seus habitantes.
Medo de não ter mais forças nem vontade de seguir viagem. Temer a despedida.
Acordar um dia e nem sequer lembrar mais de como chegou e de quanto tempo vive ali naquela casa.
Seu ideal é o amor desapegado e sincero à vida em geral. Se o foco desse amor é específico, esse é simplesmente o seu fim.

 

Nesta semana tive novamente essa experiência e sinto ainda um pouco do gostinho amargo de dizer adeus a amigos e família. Tudo começou aos poucos, como, na verdade, sempre começam essas histórias. Um estudante de design gráfico conversa comigo no ônibus. Tem aparência e olhar que inspiram confiança. A maneira como me convida para passar a noite na sua casa e conhecer sua família é tão natural que nem chega a despertar qualquer tipo de dúvida ou apreensão. É o tipo de momento no qual você simplesmente respira fundo e diz: “Vamos ver o que o dia planejou para mim”.

 

Sua casa tem 4 andares e mais um terraço. Aguardo no primeiro andar, em uma espécie de quarto e sala de estudos, sem saber exatamente o que vai acontecer em seguida. Depois de alguns minutos ele retorna com uma bandeja repleta de frutas, pão, sopa, suco e chá de menta. São mais de 8 horas da noite e essa é a primeira refeição do dia para ele, o fhtor. Estamos ainda no mês do Ramadan e todo mundo aqui segue fielmente as regras do mês de jejum escritas no Corão, livro sagrado do islã. Enquanto comemos percebo o quanto meu francês é básico e sofro por não ter me dedicado tanto durante o curso que fiz anos atrás no Brasil.

 

A cidade chama-se Rabat, a capital do Marrocos. O motivo da viagem era apenas conseguir um visto para a Mauritânia, o meu próximo destino. No outro dia, após várias horas de tentativas, encontrei finalmente a embaixada para descobrir simplesmente que pedidos de vistos são aceitos apenas pela manhã e demoram dois dias para ficar pronto. Bom, como era quinta-feira, teria que voltar na sexta para poder retirá-lo apenas na segunda, Insh´Allah!

 

Rabat é uma cidade moderna e bonita. É uma exótica mistura árabe-europeia com muros de fortalezas cercando o centro da cidade, jardins, mercados e trens modernos passando por centros comerciais revestidos com vidros espelhados de cor azul. Não era bem o que eu esperava encontrar aqui no Marrocos, mas não pensem que apenas o Brasil anda se desenvolvendo rapidamente.

 

Pensei assim em visitar outra cidade durante o final de semana e voltar na segunda para pegar o meu passaporte com o visto. Ao comunicar essa ideia ao meu mais novo amigo ele entusiasticamente estendeu o convite pediu para que eu ficasse na sua casa o tempo que fosse necessário. Bom, aceitei o convite afinal, de uma viagem, o mais valioso que possuímos é a saudade das pessoas que conhecemos no caminho.

 

Sua família é extremamente amável e aprendi muito sobre generosidade com eles. Em apenas dois dias já me tratavam como filho e membro oficial. O irmão e filho mais velho. A casa era envolta em uma atmosfera de alegria e amor e era fácil ver a fonte disso tudo nos olhos de sua mãe Nádia e de seu pai Mustafah. Comíamos juntos com sua mãe apenas assistindo e certificando-se de que todo mundo estava satisfeito. Nos últimos dias pude até ajudar a preparar os vegetais para as refeições.

 

Entre uma refeição e outra, saía com meu amigo para caminhar com seus amigos. Dávamos voltas pelo bairro e parávamos nos inúmeros cafés lotados com homens bebendo chá ou café, conversando animadamente com seus amigos. Todo mundo aqui parece ter muitos amigos e era prazeroso ver a nossa mesa sendo anexada à outra, e esta, anexada a outra, tomando conta do bar.

 

A minha mãe marroquina disse outro dia com um sorriso que iria ajudar a encontrar uma esposa para mim. Achei que ela estava apenas brincando, mas no outro dia veio me chamar e subi para a sala de estar. Encontrei lá Sahfa, em um vestido negro e lenço branco na cabeça, com seus grandes olhos escuros e sorriso encantador de histórias das mil e uma noites.

 
Ensaio fotográfico com cantor de rapper marroquino.


Meus dois novos irmãos.


Minha família marroquina.

O final dessa história só na semana que vem. Insh´Allah!

 

 

Edson Walker