O Andarilho

19.08.2011

MARROCOS

Melhor não fazer muitos planos para o dia quando você viajar aqui pelo Marrocos. Provavelmente você perderá muita energia e com muito esforço, vai conseguir terminar o seu dia sozinho e seguro em seu quarto de hotel. Mas, se você deixar-se levar pela experiência, pela sua intuição, algo novo, imerso em uma atmosfera mística, irá sempre acontecer algo, em cada um dos dias que você passar por aqui.

 

Estamos no mês do Ramadan, um período de jejum e penitência dedicado a Allah. “Onze meses são para o homem e um para Allah” é o que dizem os muçulmanos. Da aurora até o pôr-do-sol, são obrigados a abster-se de sexo, cigarro, bebida e comida. Jejum total mesmo. Nem sequer uma gotinha d´água. Às 7h20 da noite (cada dia o horário é um pouco diferente pois ele é calculado de acordo com a lua), as famílias ou grupos de amigos reúnem-se para a primeira refeição do dia, o café da manhã, fhtor, em árabe. Mais ou menos às 2h20 da manhã, algumas crianças passam pelas ruas das cidades tocando tambor. É o sinal para começar a última refeição do dia. O toque de recolher e marco do início de mais um dia de jejum, acontece às 3h20. Ramadan é um mês para fortalecer a fé, a mente e o corpo e os muçulmanos fazem-no com muita alegria.

 

Para saber mais como é essa “parada” de ficar sem comer e beber durante o dia experimentei fazer o Ramadan por dois dias seguidos. Sem comida até tudo bem, mas, sem água, nesse calor, é realmente um grande desafio. Só mesmo se você não fizer muito esforço físico durante o dia, mas, sem dúvida, é difícil essa vida de muçulmano. Minha fé não aguentou e tive que tomar pelo menos alguns goles de água durante o dia para poder desgrudar a língua do céu da boca.

 

A hospitalidade marroquina às vezes é até desconcertante. Ontem, por exemplo, me perdi pelo labirinto de ruas azuis da cidade de Chefchouen e, no final de uma rua sem saída, um senhor de longos bigodes foi logo me perguntando se eu estava com fome. Faltavam apenas alguns minutos para a hora da tão esperada refeição do dia. O convite foi tão natural e sincero que quando percebi já estava numa sala pequena com almofadas coloridas, carpete e uma pequena mesa ao centro. Logo esta foi enchendo-se de comida: chá de menta, tâmaras, figos frescos, doces e uma sopa deliciosa. Comíamos em silêncio, o que aumentava ainda mais a atmosfera dessa mística comunhão entre seres humanos, iguais perante Allah ou Deus.

 

Aos muçulmanos não lhes é permitido beber álcool, mas a “erva” está aparentemente liberada. Para vocês terem uma ideia, tem um pé de maconha no terraço do meu hotel. Parece-me que todas as culturas encontram sempre alguma maneira de relaxar as tensões do dia a dia. O Marrocos é o segundo maior exportador dos seus derivados como, por exemplo, o haxixe. Só perdem para o Afeganistão, pois aí a parada é dura. Aqui, quando te convidam para visitar a casa de alguém, logo vão te passando o cachimbo da paz. É como se fosse uma cuia de chimarrão ou um cafezinho aí no Brasil.

 

Depois da refeição na casa do meu mais novo amigo, Rachid, saímos e fomos a um restaurante para conhecer seus amigos. Gente humilde e muito hospitaleira. Ontem estive lá novamente para comer um dos pratos mais típicos daqui, o tajine. É feito dentro de uma forma, assado no forno e tem carne, cebola, tomate e mais um monte de especiarias. O tajine fica no centro da mesa e as pessoas, com um pedaço de pão na mão, vão tirando pedaços da carne e molho. É uma experiência nova dividir uma refeição dessa maneira. É muito bom. Hoje estou dividido, pois tenho que escolher entre três lugares para jantar. Problemas do excesso de hospitalidade marroquina.

 

Mas claro, nem tudo são flores. O calor chega facilmente a 42 graus. Fora isso, não há, até o momento, muito a reclamar além do fato de ter muita briga nas ruas. Não teve ainda um dia que não vi pelo menos uma confusão. Algumas são bem feias e sempre alguém está segurando uma garrafa, pedra ou pedaço de pau na mão. Outra chateação são os vendedores de drogas querendo te passar algumas gramas de haxixe, mas te deixam em paz quando você diz que não está interessado.

 

É época de figos e eu dou risada sozinho comendo-os ali embaixo das árvores. É uma das melhores experiências para mim em viagens. Tem amoras também em algumas trilhas. No domingo fomos até as montanhas aqui perto para tomar um banho de cachoeira. O tom esverdeado da água era inacreditável.

 

“Salam Aleikum”!Nos cumprimentam apertando as mãos e depois colocando a mão direita no coração. “A paz esteja contigo”. Wa Aleikum Salam, “ela está no meio de nós”.

 

Até semana que vem. Insh´Allah!

Senhor em trajes muçulmanos.


Meu amigo Hassan que pediu para tirar uma foto dele.

Praça da cidade de Chefchouen com uma fonte no centro.


 

Edson Walker