Contando Histórias

30.07.2014

ENTREVISTA COM O PRIMEIRO JUIZ DE PAZ, TAMBÉM PIONEIRO DE SANTA HELENA ERVINO HUGO DIETERICH

No dia 1º de maio o professor de História João Rosa Correia da Escola Estadual Graciliano Ramos Ensino Fundamental Séries Finais e do CEEBJA – Centro Estadual de Ensino Básico de Jovens e Adultos de Santa Helena entrevistou o Sr. Ervino Hugo Dieterich pioneiro e o primeiro Juiz de Paz do município.

A entrevista aconteceu na residência de seus sobrinhos Pedro Hübner/Loni Hübner, proprietários do Pesque e Pague Recanto do Lazer da Linha Buricá com quem o Sr. Ervino reside atualmente.

Histórico e curiosidades familiares
Ervino nasceu no município de Montenegro/RS no dia 06 de abril de 1918, portanto está com 96 anos de idade. Sua família era composta de 06 irmãs e 05 irmãos, todos de origem Alemã. Destes estão vivos Ervino, uma irmã que reside em Curitiba e outra em Nova Santa Rosa, também no Paraná.

Estudou 04 anos do antigo primário e diz ter aprendido bem o português e 02 anos de alemão. Casou-se com Alma Kohl Dieterich em Montenegro/RS no ano de 1939.

Segundo Ervino, sua esposa era parente de Helmut Kohl, ex-presidente da Alemanha e uns dos principais políticos que articulou a reunificação das duas Alemanha – Oriental/Ocidental na década de 1980. A reunificação da Alemanha aconteceu em novembro de 1989, como símbolo a queda do muro de Berlim. Sua esposa faleceu ano de 2008 em Santa Helena. Estiveram casados por 69 anos e desta união não tiveram filhos.

Seu bisavô Conrado Dieterich integrou por quatro anos o exército brasileiro e no ano de 1852, ele e mais 400 soldados brasileiros de origem alemã participaram da guerra travada entre o Brasil Império (D. Pedro II) e a República Argentina (Ditador/Presidente Rosas). Este conflito era motivado pelas disputas do controle regional e de territórios entre os dois países sul americanos. O governo imperial do Brasil (D. Pedro II) propôs aos soldados duas colônias (equivalente a 12 alqueires de terra) aos que combatessem na guerra. Ao término do conflito bélico, o governo imperial cumpriu a promessa, porém, as terras doadas eram um pedregulho puro, no município de Soledade/RS. Ressalta Ervino, que seu bisavô não fez questão de tomar posse da propriedade, por ser difícil explorá-la com viabilidade econômica.

Continuou relatando, nos anos de 1920/1930 que seus pais e alguns irmãos (incluindo Ervino) trabalhavam por conta própria na fabricação de queijos e demais derivados do leite no município de Montenegro/RS e nos finais de semana usavam o espaço da fábrica para realizar festas e bailes à comunidade em geral. Mais tarde mudaram para o município de Três de Maio/RS, e foram trabalhar na lavoura. Além de trabalharem na agricultura abriram uma fábrica de mandioca (tafona – como diziam os descendentes de alemães na época, relata Ervino) e um laticínio.

Os negócios não prosperaram como esperavam e a família entrou em dificuldades financeiras. Ervino resolveu parar de trabalhar com a família e ao conseguir acumular uma quantia de dinheiro, adquiriu dois hectares de terra no referido município e foi trabalhar na agricultura por conta própria. Relata que era difícil sobreviver na pequena propriedade agrícola.

Paraíso na Terra
Nos anos de 1950 corretores gaúchos responsáveis em vender terras no oeste do Paraná faziam intensas propagandas aos sulistas mencionando-os a respeito das imensas florestas, clima agradável, terras férteis, planas e baratas que aqui existia. Ainda reforçavam, “a região é um verdadeiro paraíso na Terra”. Dentro destas perspectivas e motivado por um de seus vizinhos Luiz de Bona, corretor e representante comercial da Empresa Madalozzo em Santa Helena, que os convenceu a vir comprovar o que diziam no RS a respeito deste lugar. Inclusive Luiz de Bona propôs ao Ervino, “se você não agradar do lugar, ficará isento de pagar a viagem de ida e volta”. Então Ervino resolveu conhecer a região.

Colonização
Chegou a Santa Helena no dia 09 de janeiro de 1959 permanecendo no município até os dias de hoje. Adquiriu três alqueires de terra nos fundos do Clube União. Voltou a Três de Maio/RS, para buscar a esposa, os utensílios domésticos e uma junta de cavalos apropriados nos trabalhos agrícolas e um carrinho de mola. Relatou também que a derrubada da mata de sua propriedade agrícola fez praticamente sozinho. Passados alguns anos trabalhando nesta propriedade, vendeu e adquiriu três terrenos na sede do município e construiu sua nova residência no local onde hoje está funcionando a Padaria Casa da Delícia próxima a Praça do Redondo.

Por várias vezes Ervino abrigou em sua residência filhos de agricultores que moravam distante da sede, para que as crianças pudessem frequentar a escola.

Desbravador
Ervino trabalhou na abertura da estrada que liga Santa Helena a Entre Rios do Oeste, onde a maior parte dos serviços era executada de forma braçal (muque, como expressa Ervino) usando machados, foices, enxadões, picaretas, entre outras. Auxiliou também na abertura das primeiras covas no cemitério de Santa Helena.

A partir de meados da década de 1960 passou a trabalhar no comércio que na época pertencia a Ângelo Catani, Orlando Weber e Arno Nagel. A casa comercial ficava ao lado do atual Supermercado Santa Helena. Era de madeira e recentemente foi desmanchada pelos atuais proprietários. A principal atividade daquele comércio era compra e venda de fumo.

Segundo Ervino, Arno Nagel foi o primeiro professor contratado pela empresa Madalozzo com a finalidade de ensinar os filhos dos santa-helenenses que aqui chegavam. A esposa de Ervino era costureira e trabalhava na sua residência prestando serviço de costura a terceiros e alfaiates, auxiliando nas despesas domésticas.

Religião e Igreja
No aspecto religioso, Ervino destaca que no início do povoamento de Santa Helena, havia descendentes de alemães seguidores de religiões evangélicas. Dentre estes, os que professavam sua fé na Igreja de Confissão Luterana no Brasil.

Sem contar com um templo para professar sua fé em Santa Helena, 09 membros luterano santa-helenenses uniram-se e construiram a Igreja localizada na Avenida Brasil bem defronte do Posto Ipiranga. Sobre a aquisição dos terrenos para edificação da Igreja, explica Ervino, João Marcelino Madalozzo proprietário da Empresa Madalozzo doou um terreno da Empresa à Igreja e facilitou a negociação de mais 02 terrenos à instituição religiosa, para que os fiéis dispusessem de um amplo ambiente, favorecendo a profissão de fé.

A construção da Igreja ocorreu no ano de 1960 e era de madeira. Por 14 anos, Ervino ocupou o cargo de Presidente daquela instituição religiosa. Ressaltou que havia uma relação de respeito entre católicos e luteranos e era comum católicos de Santa Helena Velha participarem das festividades religiosas promovidas pelos luteranos de Santa Helena e vice-versa. O próprio Ervino se lembra da amizade com o Padre José, de Missal e Martin de Santa Helena. Inclusive às vezes a banda musical em que Ervino integrava, animou as festividades religiosas da Igreja Católica nas primeiras décadas da formação do município. Além de animarem festas religiosas, animavam festas de casamentos, aniversários, carnaval e bailes em geral.

Ervino participou das bandas musicais de Santa Helena por 34 anos tocando o instrumento conhecido como pistão, orgulha-se disso.

Política
Sobre sua participação na política santa-helenense, Ervino conta que alegava que não entendia nada de política e por isso procurava viver distante das disputas eleitorais. Porém, mesmo assim candidatou-se a vereador em 1967 após muita insistência do então candidato a prefeito de Santa Helena Arnaldo Weisseimer.

Foi o único pleito que disputou e conseguiu ficar como 2º suplente da Câmara de Vereadores. Arnaldo Weisseimer saiu vitorioso na disputa eleitoral e assim elegeu-se prefeito.

Chegando à magistratura
Ao assumir a administração municipal (1967) convidou Ervino a lhe acompanhar em uma viagem até Foz do Iguaçu para uma audiência com o Juiz de Direito do Paraná Ermi Etseler, representante da justiça no oeste paranaense naquela época.

Durante a viagem Ervino indagou por diversas vezes ao prefeito Arnaldo que revelasse o real motivo desse encontro, o que não aconteceu. Ao chegar ao fórum de Foz do Iguaçu foram recebidos pelo juiz Ermi e este por intermédio do prefeito convidou-o a assumir a função de Juiz de Paz no município de Santa Helena.

O convite deixou-o muito surpreso pois, no seu entendimento, a sociedade santa-helenense dispunha de cidadãos (ãs) melhor preparados para ocupar uma função de tamanha responsabilidade. Por outro lado, analisou o seguinte, se estão me convidando, porque certamente acreditam na minha capacidade e na pessoa que sou. Sentiu-se honrado e aceitou o convite. Comentou o Juiz Ermi, Santa Helena estará bem representada tendo o senhor na função de Juiz de Paz. Só ouço falar bem do senhor, concluiu o magistrado.

Nomeado Juiz de Paz, Ervino indagou ao juiz Ermi se poderia legalmente usar arma de fogo. Respondeu o Juiz que não, por saber que Ervino era um homem respeitado no município de Santa Helena e por isso não haveria necessidade de tal artefato.

O trabalho do Juiz de Paz
Trabalhou como Juiz de Paz entre os anos de 1967 a 1972, sendo responsável na realização de casamentos.

Naquela época Juiz de Paz não recebia salário. O dinheiro que recebia vinha dos casamentos que realizava, porém, 50% ficavam para Ervino e 50% ao escrivão. Continua Ervino, “para minha sorte eram muitos os casamentos que aconteciam naqueles anos". Também atendia de quatro a cinco audiências por dia em sua casa e destes encontros alguém o remunerava de forma voluntária pelo serviço prestado. Estes atendimentos eram para conciliar conflitos de terras e familiares. Para resolver os embates procurava ouvir as partes conflitantes, com paciência, serenidade e imparcialidade, comentou. Através destas atitudes, os casos eram resolvidos sem maiores complicações, relembra Ervino. Nas palavras de Ervino, em que expressou “entrei limpo e após vários anos de trabalho de Juiz de Paz consegui sair limpo”, finalizou.

Ao término desta entrevista, Ervino publicamente agradece os sobrinhos Pedro Hübner e Loni Hübner pela acolhida na sua residência. Acrescentou: “já faz 06 anos que aqui estou residindo e estamos nos entendendo muito bem. Dou graças a Deus por ter estes parentes que me acolheram e zelam como se eu fosse seus pais. Agradeço com um eterno Deus lhes pague”.

Agradeceu também ao professor João por ter lhe entrevistado e assim pode deixar registrado um pouco de sua história vivida em Santa Helena.

Eu, professor João Rosa Correia, também agradeço a gentileza e cordialidade do Sr. Ervino ao conceder esta entrevista, relatando-nos fatos relacionados com a História de Santa Helena, os quais provavelmente a maioria dos santa-helenenses desconhece e aqui está uma oportunidade para conhecer aspectos ocultos de nossa história.


Professor João e Ervino


Ervino desfruta do recanto Pesque e Pague


Ervino, Porf. João, e os sobrinhos Loni e Pedro Hübner


Ervino, Pedro Hübner e Loni


Sogro e cunhados (as) de Ervino - R. do Sul. Sua esposa, 2ª da esquerda para direita


Casamento de Ervino e Alma Kohl - 1939 Três de Maio RS


Igreja Luterna no Brasil - Construída em 1960


Coral Igreja Luterana - Ervino aparece no alto. 1º da direita para esquerda


Ervino - assinatura de casamento. Noivos - Fantinel e Lindner


Ervino ao lado de um Sr. na localidade de SubSede SH


Ervino visitou Foz do Iguaçu - Época da Construção da Ponte da Amizade, entre 1956 a 1962


Construção da Ponte da Amizade. 1956 a 1962


Bandas que Ervino integrou por 34 anos. 2º da esquerda para direita nas três fotos


Nome da Banda - Ritmistas do Oeste


Participou da Banda de Aldair Arnold

João Rosa Correia