Contando Histórias

05.09.2014

Entrevista com o pioneiro Freno Freohlish Filho de Santa Helena

O professor de História João Rosa Correia do CEEBJA e Escola Estadual Graciliano Ramos – Ensino Fundamental Séries Finais, entrevistou o pioneiro Freno Freohlish Filho, de Santa Helena PR.

Na tarde do dia 06 de agosto de 2014, o professor João Rosa Correia entrevistou o Sr. Freno Freohlish Filho na sua residência, localizada à Rua Mato Grosso nº 1535, centro de Santa Helena, com o objetivo de conhecer sua longa história de vida. Iniciou apresentando os nomes de seus pais: Carlos Freohlish e Sibila Mavier de origem alemã. Residiam na localidade de Santo Sebastião, próximo a Porto Alegre. Sua família era composta de 08 irmãos, nascidos no Estado do Rio Grande do Sul.

No início do século XX (vinte) seus pais mudaram para Campina das Missões, distrito de Santa Rosa (oeste gaúcho). Nesta localidade Freno nasceu em 14 de janeiro de 1925. Portanto está com 89 anos de idade e com uma lucidez magnífica. Seus familiares trabalhavam no Rio Grande do Sul no ramo de compra e venda de gado bovino, curtume de peles de animais, fabricavam selas (sela – instrumento utilizado para montaria em animais) e açougueiro.

Comentou que o irmão mais velho, quando reservista, participou da Revolução de 1930: movimento militar que derrubou o último presidente oligárquico do Brasil, Washinghton Luiz, da chamada política do Café com Leite (período 1889 a 1930), acrescentou que os canhões eram puxados por cavalos.

Freno quando solteiro auxiliava seus pais nos trabalhos que eles desenvolviam, inclusive aprendeu a profissão de tropeiro, açougueiro, confeccionador de selas, mecânico de máquinas de serraria. Trabalhou de motorista de ônibus e caminhão. Quando criança foi jóquei de um clube de Santa Rosa. Nesta cidade serviu o exército brasileiro no ano de 1944 no 1º Regimento da Cavalaria Motorizada.

Ainda residindo no Rio Grande do Sul, como a família de Freno era de compradores de gado, em viagens que faziam pelo Estado a procura de animais para negociar, conversou por diversas vezes com Manoel Dorneles Vargas, irmão de Getúlio Vargas, na região de São Borja, município de origem da família Vargas, onde Getúlio Vargas tinha uma fazenda de gado. Segundo Freno, outro irmão de Getúlio Vargas, Protácio Vargas, era uma pessoa muito influente na política da região de São Borja. Sobre Getúlio Vargas, Freno o conheceu em uma das visitas do presidente a São Borja, mas não chegou conversar com o mesmo.

A região de São Borja, por ser próxima da divisa com a Argentina, possuía intenso contrabando de pneus daquele país para o Rio Grande do Sul. Mas Freno assegura que nunca se envolveu com esse tipo de trabalho. Disse que gostava de trabalhar nas diversas profissões que foi aprendendo ao longo da vida e, através do trabalho lícito, aliado a dedicação e perseverança, diz ter conseguido formar certa quantia de capital o que permitiu-lhe adquirir uma serraria no município de Maurício Cardoso RS, entre os anos de 1946 a 1948. Vendeu a serraria e comprou no mesmo município 25 hectares de terra (um hectare de terra corresponde a dez mil e cinquenta metros quadrados. Abrevia-se= ha). Com isso, tornou-se agricultor.

Garboso, Freno disse que era um rapaz muito namorador quando solteiro, namorou japonesa, italiana, judia, alemã, bastava ser mulher. No ano de 1953 Freno casou-se com a Sra. Casilda Peiter.

Mesmo que detentor de certo capital no Rio Grande do Sul, Freno resolveu aventurar no oeste do Paraná. Fator preponderante para que ele deslocasse para esta região, foram as intensas propagandas dos corretores de imóveis rurais e urbanos nas décadas de 1950/1960, da Companhia Colonizadora Agrícola Madalozzo, que falavam das excelentes terras de Santa Helena.  Ocorreu um intenso deslocamento de rio-grandenses para o oeste paranaense, Freno assim resolveu vir conhecer a região. Isto aconteceu no ano de 1958.

Conta ele que a vegetação que havia outrora no perímetro urbano de SH encontrava-se derrubada. No entanto, o traçado da futura cidade era planejado, bonito de se ver, assim recorda. O escritório da Empresa Agrícola Madalozzo estava em pleno funcionando para as negociações das áreas urbanas e rurais sob seu domínio. Freno agradou-se do lugar e de início comprou 04 lotes urbanos. Ficava próximo da atual caixa d’água da Sanepar. Também adquiriu cinco alqueires e meio (5,5) divididos em chácaras nos fundos da atual Rua Pará. Mais tarde comprou um sítio de seis alqueires e meio (6,5) de terras, onde estão as construções da UTFPR – Universidade Tecnológica Federal do Paraná – (antiga Unioeste SH) e parte das terras formam hoje a reserva de Itaipu. No entanto, somente trouxe a família (04 filhos) para Santa Helena na data de 25 de julho de 1963.

De 1958 a 1963 Freno vinha sozinho à Santa Helena. Durante o tempo que ficava em Santa Helena aos poucos foi abrindo suas terras. O trabalho de derrubadas das matas se fazia manualmente através do uso de facão, foice e machado. Contratavam-se pessoas para auxiliar nas derrubadas das matas. Alguns agricultores para abrir as estradas de acesso às suas áreas rurais no início da colonização de Santa Helena muitas vezes recorriam ao sistema de mutirão entre amigos e vizinhos. Inclusive para abrir a estrada que dava acesso à propriedade de Freno (hoje UTFPR), foi por meio de mutirão.

Segundo Freno, as terras naquela época eram baratas e de fácil aquisição, como exemplo: o próprio Feno trocou dois lotes seu por uma bicicleta de marca monarca. Freno conheceu pessoa que negociou um jeep por 20 alqueires de terras; outra pessoa que trocou um caminhão por 60 alqueires de terras. Quando a pessoa negociava diretamente a compra de uma propriedade com a Empresa Madalozzo e a proposta de pagamento fosse a dinheiro, concediam-lhe até cinco anos de prazo para quitação do bem adquirido, principalmente para as áreas agrícolas.

Freno lembra que, mesmo quando suas terras estavam em condições de plantar cereais, e ele resolveu trazer a família (1963) para Santa Helena, preocupou como alimentá-los até a próxima colheita. Para isso, preparou várias sacas de alimentos não perecíveis que deu para alimentar sua gente por um ano inteiro dos produtos que trouxe do Rio Grande do Sul, como: arroz, farinha de trigo, entre outros.

De 1963 a 1974 Freno e sua família residiram na sede do município. As chácaras adquiridas anos atrás, na medida em que apareciam compradores, acreditando que estava realizando bom negócio, negociava-as. Paralelamente ao trabalho na agricultura, Freno prestava assistência técnica aos proprietários de serrarias de Santa Helena, pois era uma das profissões que desenvolvia quando residia no RS.

Afirma Freno, que após a serraria de Cirilo Caumo ter sido destruída pelo fogo no início dos anos de 1960, auxiliou Caumo na montagem e regulagem dos equipamentos da nova serraria. A referida serraria ficava próximo de onde hoje é a curva do Obregon. Além de colaborar com Cirilo Caumo, ajudou na construção de outra serraria do Varguinha na Linha Progresso, região indenizada pela Itaipu. Também colaborou na construção da serraria de Paulo Donato, que ficava próxima ao Cemitério Municipal de Santa Helena. Assegura Freno que a maioria dos trabalhos prestados por ele fazia de forma voluntária, pelo prazer de ajudar os companheiros e amigos.

A fama de Freno como excelente mecânico e regulador das máquinas de serraria, saiu dos limites geográficos de Santa Helena. Recebeu convite e chegou a dar assistência técnica em serrarias no Estado de Mato Grosso e na vizinha nação Paraguai.

No Paraguai, ao término de seus trabalhos, recebeu simplesmente um obrigado, ficando as despesas de alimentação por sua conta. No Mato Grosso não foi diferente, o proprietário disse que pagaria pelo seu trabalho assim que viesse a Santa Helena. Segundo Freno, isso nunca aconteceu. Novamente ficou com a custa de alimentação e o tempo que teve que deslocar a aquele Estado. Quanto às despesas de transporte de ida e volta, ficava por conta dos interessados em seu trabalho.

Entre 1974 a 1982, Freno morou em seu sítio, local que atualmente encontra-se a UTFPR. Obrigou-se a sair da propriedade porque houve a indenização das terras para a formação do Lago de Itaipu. Ressalta Freno ao dizer que ele estava entre os últimos agricultores de Santa Helena a receber o dinheiro indenizatório de Itaipu. Como houve grande procura de propriedades agrícolas para ser comprada pelos agricultores indenizados de Itaipu (1982), isto fomentou enorme especulação imobiliária de áreas agricultáveis no município de Santa Helena e também nas demais regiões do extremo oeste paranaense. Com isso o valor do preço das terras aumentou significativamente.

Com o descompasso entre o dinheiro recebido da Itaipu e a majoração do valor das terras, rapidamente Freno estava descapitalizando. Para empregar o dinheiro da indenização, Freno adquiriu um sítio de cinco alqueires no município de Quatro Pontes (oeste do PR) em 1982.  Disse que contratou Galdino Buzanelo para transportar sua mudança. Relatou que foram necessários cinco viagens de caminhão Mercedes para conseguir levar todos os utensílios domésticos e outros bens que a família possuía, sendo: 12 mil telhas, 50 metros cubicos de madeira de lei, um trator tobata e uma caretinha.

De 1982/1983 ficou trabalhando na lavoura no município de Quatro Pontes. Plantava mandioca, arroz, entre outros. No ano de 1984 separou da esposa, venderam a propriedade em Quatro Pontes e dividiram os bens materiais entre si conforme determinava a lei. Ao retornar a Santa Helena (1984), com 59 anos de idade passou a prestar diversos serviços no município, até conseguir aposentar-se. Desde então, por diversas vezes viajou ao Rio Grande do Sul para rever parentes e amigos, bem como para Barreira, na Bahia, visitando um de seus filhos que na década de 1990 mudou-se para aquele Estado.

Para encerrar a entrevista, perguntei ao Freno, se alguma vez tentou participar da vida política/partidária de Santa Helena, assim respondeu:

“Não! Porque a meu ver, é complicado demais. O então candidato a prefeito de Santa Helena Arnaldo Weisseimer pediu para que eu disputasse uma vaga de vereador no pleito de 1967. Disse ao Arnaldo, vou ser reprovado no curso para político, explico porque, 1º- o candidato precisa possuir diversas caras, eu só tenho uma; 2º- saber mentir sem piscar os olhos; 3º– prometer tudo e não fazer nada. Remendou, para mim isto não serve”.

 

Freno deixou a seguinte mensagem:

“Acredito que, como brasileiro, fiz minha parte, principalmente numa época que não tinha luz, água encanada e demais conforto dos tempos atuais. Vim para o mato e que aqui nada tinha. Tudo estava para ser construído. Ajudei construir Santa Helena. Peço a juventude que preserve, cuide e lute para melhorar Santa Helena”.

Agradeço ao Sr. Freno pela entrevista. Apesar dos seus quase 90 anos de idade, apresenta sempre disposto, alegre, acolhedor. Reside sozinho, realiza a limpeza da residência, cozinha seus alimentos. Que as forças positivas conversem-no por muitos anos com a vivacidade dos dias de hoje. A história de seu cotidiano relatada por ele e aqui registrada, certamente colaborará para enriquecer a história de Santa Helena da qual foi um dos grandes partícipes. Prof. João R. Correia.

Todas as fotos do documentário foram cedidas pelo entrevistado.

Freno e Prof. João Freno e Prof. João
Freno Freno
Familiares de Freno RS. Familiares de Freno RS.
Freno- menor da foto, irmãos e sua mãe RS. Freno- menor da foto, irmãos e sua mãe RS.
Serraria de Freno Maurício Cardoso RS Serraria de Freno Maurício Cardoso RS
Freno o que aparece totalmente de branco, RS. Freno o que aparece totalmente de branco, RS.
Freno o que aparece com cuia na mão RS. Freno o que aparece com cuia na mão RS.
Freno. Terceiro da equerda p - direita. Mutirão para abrir a rua de acesso a atual UTFPR - SH 1960. Freno. Terceiro da equerda p - direita. Mutirão para abrir a rua de acesso a atual UTFPR - SH 1960.
Casamento de Breno e Casilda 1953 RS. Casamento de Breno e Casilda 1953 RS.
Casilda e Freno. Casilda e Freno.
São Mayer. Baixada amarela. Década de 1960. Festa do Dia do Colono. Desmanchado. São Mayer. Baixada amarela. Década de 1960. Festa do Dia do Colono. Desmanchado.
Salão Mayer. Festa do Dia do Colono. Década de 1960. Salão Mayer. Festa do Dia do Colono. Década de 1960.
Lazer. Dança Polonesa. Freno e Casilda. Casal da frente. Década de 1970. Local, antigo Salão do Verde. Ficava próximo a atual Ponte de ligação com Sub Sede. Coberta pelas águas de Itaipu. Lazer. Dança Polonesa. Freno e Casilda. Casal da frente. Década de 1970. Local, antigo Salão do Verde. Ficava próximo a atual Ponte de ligação com Sub Sede. Coberta pelas águas de Itaipu.
Freno e esposa. Salão Verde. Década de 1970. Freno e esposa. Salão Verde. Década de 1970.
Freno e esposa. Década de  1970 Freno e esposa. Década de 1970
Freno e equipe de tiro. Local - Linha Verde. Próxima a atual Ponte de ligação entre SH e Sub Sede. Década de 1970. Freno e equipe de tiro. Local - Linha Verde. Próxima a atual Ponte de ligação entre SH e Sub Sede. Década de 1970.
Freno da esquerda recebendo prêmio de campeão de tiro. Salão Verde SH. Década de 1970. Freno da esquerda recebendo prêmio de campeão de tiro. Salão Verde SH. Década de 1970.
Família de Freno. Década de 1980. Família de Freno. Década de 1980.
Freno em visita a gruta em que está a Igreja- Bom Jesus da Lapa Bahia. Década de 1990. Freno em visita a gruta em que está a Igreja- Bom Jesus da Lapa Bahia. Década de 1990.
Vista externa do morro onde encontra a gruta da Igreja Bom Jesus da Lapa Bahia. Vista externa do morro onde encontra a gruta da Igreja Bom Jesus da Lapa Bahia.
Freno na escada de acesso a Igreja Bom Jesus da Lapa Bahia. Década de 1990. Freno na escada de acesso a Igreja Bom Jesus da Lapa Bahia. Década de 1990.
Professor João e Freno. 06 - 08- 2014 Professor João e Freno. 06 - 08- 2014
Freno e Prof. João. Freno e Prof. João.

João Rosa Correia