28.07.2008

2ª QUINZENA - JULHO 2008

RAUL SEIXAS: “O rock’n’roll morreu em 1959”.  Parte I

Vasculhando minhas revistas antigas de rock encontrei essa preciosidade, uma entrevista de Raul Seixas a Revista BIZZ, edição 06, janeiro de 1986. Em homenagem ao Dia Mundial do Rock, comemorado em 13 julho, transcrevo alguns trechos da entrevista.
Como foram os shows na Amazônia?
Fantástico, os garimpeiros ficaram fascinados. Eu li todo o manifesto de Aleister Crowley (“faze o que tu quiseres, será tudo da lei...”) e eles aplaudiram e sentiram cada palavra. Agora o pessoal que manda mesmo é uma bandidagem danada. Barra pesadíssima.
Quando você começou a ouvir rock?
Eu tinha nove anos e morava perto do consulado americano. Andava muito com o pessoal de lá e foram eles que me apresentaram Little Richard (o primeiro que fez a minha cabeça), Howlin Wolf, Bo Diddley, Chuck Berry.
E quando você começou a tocar?
Eu já tocava profissionalmente aos dez anos, nos Relâmpagos do Rock. Eu tinha um amplificador que era um rádio de válvula do meu avô, adaptado pelo meu pai. O fio era curto e a gente tinha que ficar preso no rádio. Isso em 54, 55, ninguém sábia o que era rock. Eu tocava e me atirava no chão imitando o Little Richard, como eu via nos filmes americanos que passavam e sempre notava que as primeiras filas ficavam vazias. É que as mães pensavam que eu era epilético, com meu topete de brilhantina e camisa aberta com gola levantada. Tocávamos assim até 66, quando fui gravar Raulzito e Seus Panteras.
Você não gosta de Palco?
Eu curto o palco, na hora em que eu entro acaba tudo. Como disse John Lennon “eu vomito toda vez que vou subir ao palco”. Com 40 anos de idade ainda fico nervoso.
E o que você acha do rock agora?
Dizem que se faz rock’n’roll por aí. Pra mim, ele morreu em 59. Rock’n’roll era um comportamento, James Dean, todo momento histórico. Aí veio o caos quando as indústrias não podiam mais parar de fabricar discos. Quando entrou a década de 60, botaram Chubby Checker para cantar “Hava Naguila”, inventaram o hully-gully e o twist, tudo invenção de fábrica. O movimento já tinha passado. Do Led Zepplin, por exemplo, eu gosto. O pior é que no Brasil não está se dizendo nada. Acho que voltamos naquela época de Cely e Tony Campello, em que se fazia rock  “papai e mamãe”.
Você não gosta de ninguém?
Gosto do Camisa de Vênus. A arte é o espelho social de uma época. As letras acabam inseridas dentro do ponto de vista do que está acontecendo, tipo Nova República (risos). A Tv Globo, essa controla esses conjuntinhos todos.
E você?
Eu continuo fazendo meu trabalho. Você vê o Metrô Linha 743, ele foi completamente podado pela Som Livre. Aliás, aproveito esta entrevista para pedir rescisão do meu contrato. Quando eu gravei o LP, fui para os EUA e gastei oito mil dólares do meu dinheiro para pesquisar filmes em preto e branco. A música do Metrô Linha 743 é preta e branca. Ela é de pau e briga, não tem nada de colorida. Aí eles não tocaram, não divulgaram. Ficou por aí.
E você quer continuar dando muro nessa ponta de punhal?
Quero e quero, vale à pena. Caso contrário, não durmo à noite. Estamos vivendo uma época caótica mesmo, mas este caos é o prenúncio de uma nova era. De dez em dez anos, ou de quinze em quinze, as coisas mudam. Nada de Nova República nada disso... As coisas mudam no planeta terra. Como aconteceu nos anos 50 com a geração pós-guerra.
E a sua “Sociedade Alternativa”?
Continua vigorando o tempo todo, não importa de que maneira. São alternativas concretas mesmo, que tem de se solidificar, mas não mais com palavras, nem com porta-estandarte... Até já fui expulso do país por isso.